Somente a Bíblia? - Razões para rejeitar a Sola Scriptura
1.
O que é Sola Scriptura?
2.
Não é ensinada em parte
alguma da Bíblia
3.
A Bíblia indica que devemos
aceitar a Tradição Oral
4.
A Bíblia qualifica a Igreja
coluna e fundamento da verdade
5.
Cristo nos fala para submetermo-nos
à autoridade da Igreja
6.
A Escritura afirma que
é insuficiente como orientadora
7.
Os primeiros cristãos não
tinham uma Bíblia completa
8.
A Igreja produziu a Bíblia,
e não o contrário
9.
É completamente estranha
à Igreja Primitiva
10. Os heresiarcas baseiam-se na interpretação sem
o Magistério
11. O cânon da Bíblia não estava formado até o século
4
12. O cânon foi definido por uma autoridade "extrabíblica"
13. Crer que a Bíblia é "auto-autenticável"
não tem base
14. Nenhum dos escritos bíblicos originais existe mais
15. Os manuscritos bíblicos possuem milhares de variações
16. Existem centenas de versões Bíblicas
17. A Bíblia não estava disponível a todos até o século
15
18. A Sola Scriptura
não existia antes do século 14
19. Produz maus frutos, como divisões e disputas
20. Não permite a interpretação definitiva da Bíblia
21. Faltam sete livros na Bíblia protestante
22. Se originou dos problemas emocionais de Lutero
23. Considerações finais
24. Referências
O QUE É Sola Scriptura?
"Eu não creria no Evangelho, se a isto não me
levasse a autoridade da Igreja Católica"
(St. Agostinho - Contr. Epist. Manichaei. v, 6)
Nós cremos somente na Bíblia, e a Bíblia inteira
é a única regra de fé para o cristão.
Talvez você já tenha ouvido esta frase ou algo parecido
de um protestante evangélico. Ela é, em essência, o significado da doutrina da Sola Scriptura, ou Somente a Escritura, que alega que a Bíblia - interpretada individualmente
pelo crente - é a única fonte de autoridade religiosa e é a única regra ou o único
critério em quê o crente deve acreditar. Por esta doutrina, que é uma das fundamentais
doutrinas do protestantismo, o protestante nega que exista qualquer outra fonte
de autoridade religiosa ou revelação divina à humanidade.
A Igreja Católica, por outro lado, afirma que a regra
imediata ou direta de fé é o ensino da Igreja. Este, por sua vez, tem suas Fontes da Revelação Divina - A Palavra Escrita, a Sagrada Escritura, e a Palavra não-Escrita, conhecida como Tradição. A autoridade do Magistério da Igreja Católica (chefiado
pelo Papa), apesar de não ser ela própria uma fonte de revelação divina, possui
a missão de interpretar e ensinar tanto a Escritura como a Tradição. Estas duas
formas são as fontes da doutrina cristã, a regra de fé cristã remota ou indireta.
Obviamente, estas duas visões apresentadas são opostas,
e aquele que busca seguir Cristo deve ter a certeza de que está seguindo a verdadeira.
A doutrina da Sola Scriptura se originou com Martinho Lutero, um monge alemão do século 16 que quebrou
sua união com a Igreja Católica Romana e iniciou a Reforma Protestante [1]. Em resposta a alguns abusos que ocorriam na Igreja, Lutero tornou-se
um grande oponente de certas práticas. Como tais abusos de fato ocorriam, Lutero
estava correto em se revoltar. Contudo, houve uma série de confrontos entre ele
e a hierarquia católica. E à medida que foram evoluindo, as disputas foram se centrando
na questão da autoridade da Igreja e - pelo ponto de vista de Lutero - se o ensino
da Igreja deveria ser considerado regra de fé legitima para os cristãos.
Crescendo as disputas entre Lutero e a hierarquia
da Igreja, ele a acusava de haver corrompido a doutrina cristã e distorcido as verdades
bíblicas, e cada vez, mais e mais, ele acreditava que a Bíblia, interpretada por
cada indivíduo, era a única regra de fé religiosa para o cristão. Rejeitou a Tradição
assim como a autoridade do ensino da Igreja Católica (com o Papa como sua cabeça)
como tendo legítima autoridade religiosa.
Um observador honesto poderia perguntar, portanto,
se a doutrina de Lutero sobre a Sola Scriptura seria uma restauração genuína das verdades bíblicas ou a promulgação de uma
visão pessoal acerca da autoridade da Igreja. Lutero era um apaixonado pelas suas
crenças, e foi bem-sucedido em divulgá-las, mas estes fatos por si só não são garantia
alguma de que o que ensinou esteja correto. Pelo fato de o bem-estar, e mesmo o
destino eterno das pessoas, ser uma aposta de confiança, o fiel cristão precisa
estar precisamente seguro neste assunto.
Nos parágrafos seguintes declaramos vinte e uma considerações
que ajudarão você, leitor católico ou protestante, a analisar cuidadosamente a doutrina
luterana da Sola Scriptura de um ponto de vista bíblico, histórico e lógico, e que
mostrará que de fato esta não é uma doutrina bíblica genuína, mas somente uma doutrina
de homens.
[Topo]
NÃO É ENSINADA EM PARTE ALGUMA DA BÍBLIA
Talvez a razão que mais chame a atenção para rejeitar
esta doutrina é que não existe nem mesmo um só versículo onde esta seja ensinada,
e isto, portanto, torna esta doutrina auto-refutada.
Os protestantes comumente citam versículos tais como 2 Tm 3,16-17 ou Ap 22,18-19 em defesa da Sola Scriptura, mas um exame minucioso destas duas passagens facilmente
irá demonstrar que na verdade estas não suportam tal doutrina.
Em 2 Tm 3,16-17 lemos: Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para ensinar,
refutar, corrigir, educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito,
qualificado para qualquer boa obra. Existem aqui cinco considerações que enfraquecem a interpretação protestante
desta passagem:
1.
A palavra grega ophelimus utilizado no
v.16 significa útil e não suficiente. Um exemplo desta diferença seria dizer que a
água é útil para nossa existência - mesmo necessária - mas não é suficiente; isto
é, ela não é o único componente que nos manteria vivos. Também precisamos de alimentos,
medicamentos, etc. Da mesma forma, a Escritura é útil na vida do cristão, mas isto
nunca quis dizer que ela é a única fonte de ensino cristão e a única coisa que cada
o necessita.
2.
A palavra grega pasa, que geralmente é traduzida como toda, na realidade
significa qualquer, e seu sentido se refere a cada uma ou qualquer
uma das classes denotadas pelo substantivo a que está conectado [2]. Em outras palavras,
a forma grega indica que toda e qualquer Escritura é útil. Se a doutrina da Sola Scripturafosse verdadeira, baseada no verso grego 16, todo e qualquer livro
da Bíblia poderia, isoladamente, ser considerado a única regra de fé, uma posição
que é obviamente absurda.
3.
A Escritura a que Paulo
se refere é o Antigo Testamento, um fato que é claramente referido pelo fato de
as Escrituras serem conhecidas desde a tenra infância (v.15) por
Timóteo. O Novo Testamento como conhecemos ainda nem mesmo existia, ou na melhor
das hipóteses estava incompleto, então não poderia estar incluído no que Paulo quis
dizer com o termo Escritura. Se aceitarmos as palavras de Paulo sem analisarmos
o que realmente significam, a Sola Scriptura, então, significaria que a única regra de fé do cristão é o Antigo
Testamento. Esta é uma conclusão que todos os cristãos rejeitariam. Os protestantes
responderiam a este argumento dizendo que Paulo não está tratando do cânon da Bíblia (os
livros inspirados que constituem a Bíblia), mas sim da natureza da Escritura.
Ainda que haja alguma validade nesta afirmação, a questão do cânon também é relevante
aqui, pelas seguintes razões: antes que falemos da natureza das Escrituras como sendo theopneustos, ou seja, inspirados (literalmente "soprados por Deus"), é imperativo que identifiquemos
com segurança os livros que queremos listar como Escritura; de outra forma, livros
errados poderia ser chamados de inspirados. Obviamente,
as palavras de São Paulo aqui tomaram uma nova dimensão quando o Novo Testamento
foi completado, e os cristãos eventualmente as consideravam, também, como sendo Escritura. Deve ser dito, então, que o cânon bíblico também entra na questão,
pois Paulo - escrevendo sob a inspiração do Espírito Santo - enfatiza o fato de
que toda (e não somente alguma) Escritura
é inspirada. A questão que deve ser discutida, entretanto, é esta: como podemos ter a certeza de que temos todos os livros corretos? Obviamente, somente poderemos conhecer a resposta se soubermos qual
é o cânon da Bíblia. Tal questão guarda um problema para os protestantes, mas não
para os católicos, pois estes possuem uma autoridade infalível que pode responder.
4.
A palavra grega artios, aqui traduzida como perfeito, à primeira
vista pode fazer crer que a Escritura é de fato tudo o que é necessário. "Logo",
alguém poderia perguntar, "se as Escrituras tornam o homem de Deus perfeito,
que mais seria preciso? Por acaso a palavra 'perfeito' não significa que nada mais
é necessário?". Bem, a dificuldade com esta interpretação é que o texto não
diz que somente pelos meios da Escritura o homem de Deus é tornado perfeito. O texto
indica precisamente o oposto, pois é verdadeiro que a Escritura opera em conjunção
com outras coisas. Note que não é qualquer um que se torna perfeito, mas o homem
de Deus - que significa um ministro de Deus (cf. 1 Tm 6,11), um sacerdote.
O fato deste indivíduo ser um ministro de Cristo pressupõe que ele já estava acompanhando
um estudo que o prepararia para exercer tal ofício. Sendo assim, a Escritura poderia
ser mais um instrumento dentro de uma série de outros que tornam o homem de Deus
perfeito. As Escrituras poderiam complementar sua lista de itens necessários ou
poderiam ser o item mais proeminente da lista, mas seguramente não eram a única ferramenta
de sua lista nem pretendia ser tudo o que necessitaria. Por analogia, considere
um médico. Neste contexto, poderíamos dizer algo como "OTratado de Medicina Interna do Harrison (livro texto de referência na prática médica mundial) torna nossa prática
médica perfeita, logo estamos aptos a qualquer procedimento médico". Obviamente
tal afirmativa não pode significar que tudo o que o médico precisa seja o TMIH. Este é um item entre vários outros, ou o mais proeminente. O médico
também necessita de um estetoscópio, um tensiômetro, um otoscópio, um oftalmoscópio,
técnicas cirúrgicas, etc. Estes outros itens são pressupostos pelo fato de estarmos
falando de um médico, e não de um leigo. Logo, seria incorreto presumir que somente
o TMIH torna o médico perfeito, a única ferramenta necessária.
Além disso, considerar que a palavra perfeito significa o único item necessário resulta em
contradição bíblica, pois em Tg 1,4 lemos que a paciência - sem citar as Escrituras - torna os homens perfeitos e íntegros, livres de todo defeito. É verdade que aqui uma palavra grega diferente
- teleios - é usada para perfeitos, mas permanece o fato de que o entendimento
básico é o mesmo. Então, se alguém certamente entende que a paciência não é a única
ferramenta que o cristão precisa para ser perfeito, um método interpretativo consistente
levar-nos-ia a reconhecer da mesma forma que as Escrituras não são a única coisa
que o homem de Deus necessita para ser perfeito.
5.
A palavra grega exartio no v.17, traduzida
por qualificado (outras Bíblias trazem algo como equipado ou plenamente qualificado) é tida como uma prova pelos protestantes da Sola Scriptura pois esta palavra
- novamente - implica em dizer que nada mais é necessário ao homem de Deus. Contudo, ainda que o homem de Deus seja qualificado ou plenamente equipado, este fato por si mesmo não garante que este homem
saiba interpretar e aplicar corretamente uma passagem bíblica. O sacerdote deve
também aprender como usar corretamente as Escrituras, mesmo que ele já esteja equipado com elas. Considere de novo a analogia do médico.
Pense num estudante de medicina no início de seu internato. Ele deve dispor de todo
seu arsenal necessário para os procedimentos cirúrgicos, ou seja, ele deve estar qualificado, plenamente equipado para qualquer procedimento de emergência, mas a menos que ele passe
boa parte do tempo junto a médicos mais experientes, observe suas técnicas, aprenda
suas habilidades, e pratique algum procedimento ele próprio, os instrumentos cirúrgicos
que possui são completamente inúteis. Sem dúvida, se não aprender a usar tais instrumentos apropriadamente, estes mesmos podem se tornar armas perigosas em suas mãos. Quem se
habilitaria a submeter-se a um cirurgião que aprendeu cirurgias por cursos de correspondência?
Da mesma forma ocorre entre o homem de Deus e a Escritura.
Estas, como os instrumentos cirúrgicos, são preciosos apenas quando bem manipulados.
Do contrário, os resultados são o oposto do esperado. Mal usados, um pode trazer
a dor e a morte física, a outra, a dor e a morte espiritual. Devido a Escritura
nos advertir a mantermos a retidão da palavra da verdade ( cf. 2 Tm 2,15), é óbvio, portanto, que a palavra da verdade pode
ser desviada de seu correto caminho - da mesma forma que um estudante de medicina
destreinado que usa incorretamente seu instrumental.
Com relação ao Ap 22,18-19, há duas considerações que desqualificam a Sola Scriptura. A passagem - quase a última da Bíblia - diz: Eu atesto a todo o que ouvir as palavras proféticas
deste livro: Se alguém lhes fizer qualquer acréscimo, Deus lhes acrescentará as
pragas escritas nesse livro. E se alguém tirar qualquer coisa das palavras deste
livro profético, Deus lhe retirará a sua parte da árvore da vida e da cidade santa,
que estão descritas neste livro.
1.
Quando os versos
desta passagem afirmam que nada deve ser acrescentado ou retirado das palavras deste livro profético, não estão se referindo à Sagrada Tradição sendo acrescentada à Sagrada Escritura.
É óbvio pelo contexto que o livro aqui referido é o do Apocalipse, e não a Bíblia inteira. Sabemos disso porque São João diz que o que
for culpado por acrescentar a este livro será penalizado com as pragas escritas neste livro, as pragas que ele mesmo descreveu em seu próprio
livro, o Apocalipse. Afirmar algo diverso disso é atentar contra o texto e distorcer
seu claro significado, especialmente devido a Bíblia que conhecemos ainda não existir
quando esta passagem foi escrita, sendo assim não poderia significar o compêndio
cristão [3].
Na defensiva de sua interpretação, os protestantes trarão o argumento de que Deus
vê adiante, vê qual seria o cânon da Bíblia, sendo o Apocalipse o último livro da
Bíblia, e portanto Ele definiu o cânon com as palavras dos vv.18-19. Mas esta interpretação
necessita que busquemos o significado do texto. Além do mais, se tal afirmação for
correta, como o cristão pode saber inquestionavelmente que Ap 22,18-19 está selando o cânon a menos
que um intérprete infalível lhe confirme que este é, inquestionavelmente, o único
sentido deste verso? Porém, se tal autoridade existe, então a doutrina da Sola Scriptura - ipso facto - torna-se
nula e a ser evitada.
2.
A mesma advertência
de não acrescentar ou subtrair palavras é vista em Dt 4,2, que diz: Nada acrescentareis às palavras dos mandamentos que
vos dou, e nada tirareis; assim guardareis os mandamentos do SENHOR, vosso Deus,
que eu vos dou. Se aplicarmos uma interpretação paralela com este
verso, logo tudo o que está na Bíblia além dos decretos das leis do Antigo Testamento
deveria ser considerado apócrifo ou não canônico - incluindo o Novo Testamento!
Mais uma vez, todos os cristãos rejeitam, imediatamente, esta conclusão. A proibição
de Ap 22,18-19 contra a adição, portanto, não pode significar que os cristãos estão
proibidos de buscar algum guia fora da Bíblia.
[Topo]
A BÍBLIA INDICA QUE DEVEMOS ACEITAR A TRADIÇÃO
ORAL
São Paulo recomenda e ordena a manutenção da Tradição
Oral. Em 1 Cor 11,2, por exemplo, lemos: Eu vos felicito por vos lembrardes de mim em toda
ocasião e conservardes as tradições tais como eu vo-las transmiti [4]. São Paulo está claramente recomendando que mantenham
a tradição oral, e deve ser notado em particular que ele congratula os fiéis por
fazê-lo (Eu vos felicito...). Também é explícito no texto o fato de que a integridade
desta Tradição oral apostólica era claramente mantida, da mesma forma como Nosso
Senhor havia prometido, sob o auxílio do Espírito Santo (cf. Jo 16,13).
Talvez o mais claro apoio bíblico para a Tradição
oral seja 2 Ts 2,15, onde os cristãos são enfaticamente
advertidos: Assim, pois, irmãos, ficai inabaláveis
e guardai firmemente as tradições que vos ensinamos, de viva voz ou por carta. Esta passagem é significante
porque: a) mostra uma tradição oral apostólica vivente, b) diz que os cristãos estarão
firmemente fundamentados na fé se aderirem a estas tradições e c) claramente afirma
que estas tradições eram tanto escritas como orais. A Bíblia distintamente mostra
aqui que as tradições orais - autênticas e apostólicas em sua origem - deveriam
ser seguidas como componente válido do Depósito da Fé, então por quais razões ou desculpas os protestantes
a rejeitam? Com qual autoridade podem rejeitar uma exortação clara de Paulo?
Além do mais, devemos considerar o texto desta passagem.
A palavra grega krateite, traduzida aqui como guardar, significa estar firme, forte, prevalecer [5]. Esta linguagem é enfática,
e demonstra a importância da manutenção destas tradições. Obviamente, devemos diferenciar
o que seja Tradição (com T maiúsculo), que é parte da revelação divina, das tradições
da Igreja (com t minúsculo) que, mesmo que sejam boas, desenvolveram-se
tardiamente na Igreja e não fazem parte do Depósito da Fé. Um exemplo de algo que
seja parte da Tradição seria o batismo infantil;
um exemplo de tradições da Igreja seria o calendário
das festas dos santos. Tudo que venha da Sagrada Tradição é de origem divina e são imutáveis, enquanto que as tradições da Igreja são cambiáveis pela Igreja. A Sagrada
Tradição serve-nos como regra de fé por mostrar no quê a Igreja tem consistentemente
crido através dos séculos e como ela sempre entendeu uma determinada parte Bíblica.
Uma das principais formas pelo qual a Sagrada Tradição foi transmitida a nós está
nas doutrinas dos textos litúrgicos antigos, o serviço divino da Igreja.
Todos já notaram que os protestantes acusam os católicos
de promoverem doutrinas novas e antibíblicas baseadas na Tradição, por afirmarem que tal Tradição contém doutrinas
que são estranhas à Bíblia. Entretanto, esta acusação é profundamente falsa. A Igreja
Católica ensina que a Tradição Oral não contém nada que seja contrário à Tradição
Escrita. Alguns pensadores católicos afirmam, inclusive, que não há nada na Tradição
Oral que não seja encontrado na Bíblia, mesmo que implicitamente ou em formas seminais.
Certamente as duas estão em perfeita harmonia e complementam uma à outra. Para algumas
doutrinas, a Igreja faz uso da Tradição mais que pelas Escrituras para seu entendimento,
mas mesmo estas doutrinas estão incluídas nas Sagradas Escrituras. Por exemplo,
as doutrinas seguintes são preferencialmente baseadas na Sagrada Tradição: batismo infantil, o cânon das Escrituras, o domingo
como Dia do Senhor, a virgindade perpétua de Maria e a assunção de Maria.
A Sagrada Tradição complementa nossa compreensão
da Bíblia ao mesmo tempo que não constitui uma fonte extrabíblica de revelação,
com doutrinas novas ou estranhas a ela. Muito pelo contrário: a Sagrada Tradição
age como a memória viva da Igreja, relembrando-a constantemente o que criam os cristãos
antigos, como entendiam e interpretavam as passagens bíblicas [6]. De certa forma,
é a Sagrada Tradição que diz ao leitor da Bíblia: Você está lendo um livro muito importante, que contém
a revelação de Deus aos homens. Agora deixe-me explicá-lo como ela sempre foi entendida
e praticada pelos cristãos desde o início dos tempos.
[Topo]
A BÍBLIA QUALIFICA A IGREJA COLUNA E FUNDAMENTO
DA VERDADE
É muito interessante que em 1 Tm 3,15 vemos não a Bíblia, mas a Igreja - isto é, a comunidade viva de crentes fundada
sob Pedro e os apóstolos e mantida pelos seus sucessores - sendo chamada de coluna e fundamento da verdade. Claramente esta passagem de
modo algum significa diminuir a importância da Bíblia, mas sua intenção é de mostrar que Jesus Cristo de fato estabeleceu
um magistério autorizado que foi enviado a ensinar todas as nações (cf. Mt 28,19) Em outro lugar esta mesma Igreja recebeu de Cristo a promessa
de que os portões do inferno não prevaleceriam contra ela (cf. Mt 16,18), pois Ele
sempre estaria presente (cf. Mt 28,20) e enviaria o Espírito Santo para ensiná-la
todas as verdades (cf. Jo 16,13). Ao chefe visível de sua Igreja, São Pedro, Nosso
Senhor disse: Te darei as chaves do Reino dos
Céus. Tudo que ligares na terra será ligado no céu; e tudo que desligares na terra
será desligado no céu (Mt 16,19). É evidente a partir
destas passagens que Nosso Senhor enfatiza a autoridade de Sua Igreja e a norma
que deveria seguir para salvaguardar e definir o Depósito da Fé.
Também é evidente destas passagens que esta mesma
Igreja seria infalível, pois se em algum lugar de sua história a Igreja ensinou
o erro em matéria de fé e moral - ainda que temporariamente - cessaria de ser esta coluna e fundamento da verdade. Pelo fato de todo fundamento
existir para ser firme e permanente, e de que as passagens acima não permitem a
possibilidade da Igreja ensinar algo contrário à reta fé e moral, a única conclusão
plausível é que Nosso Senhor foi muito preciso em estabelecer a sua infalibilidade
quando chamou-a de coluna e fundamento da verdade.
O protestante, entretanto, vê aqui um dilema quando
afirma que a Bíblia é a única regra de fé para seus crentes. Qual a capacidade,
então, da Igreja - coluna e fundamento da verdade - se não deve servir para estabelecer autoridade alguma?
Como a Igreja pode ser coluna e fundamento da verdade se não é palpável, habitualmente prática para servir
como autoridade na vida do cristão? O protestante efetivamente nega que a Igreja
seja o fundamento da verdade por negar que ela possua qualquer autoridade para ensinar.
Além disso, os protestantes entendem o termo Igreja como sendo algo diferente do que entende a Igreja Católica. Os protestantes
veem a igreja como uma entidade invisível, e para eles ela é a coletividade de todos os cristãos ao redor do mundo
unidos na fé em Cristo, apesar das grandes variações nas doutrinas e alianças denominacionais.
Os católicos, por outro lado, entendem que não somente os cristãos unidos na fé
em Cristo formam seu corpo místico, mas entendemos simultaneamente que esta seja
- e somente uma - a única organização que possa traçar uma linha ininterrupta até
os próprios apóstolos: a Igreja Católica. É esta Igreja e somente esta Igreja que
foi estabelecida por Cristo e que tem mantido uma consistência absoluta em doutrina
através de sua existência, e, portanto, é somente esta Igreja que pode requerer
ser a coluna e fundamento da verdade.
O protestantismo, por comparação, tem conhecido história
de fortes vacilos e mudanças doutrinárias, e nem mesmo duas denominações concordam
entre si completamente - mesmo quanto a doutrinas importantes. Tais mudanças e alterações
não permitem que sejam consideradas fundamento da verdade. Quando os fundamentos de uma estrutura alteram-se
ou são dispostos inapropriadamente, este mesmo fundamento é fraco e sem suporte
firme (Mt 7,26-27). Pelo fato de o protestantismo ter experimentado mudanças tanto
intradenominacional quanto entre as diversas denominações que surgem continuamente,
estas crenças são como uma fundação que muda constantemente. Tais credos então cessam
de prover o suporte necessário para manter a estrutura que sustentam, e a integridade
dessa estrutura fica comprometida. Nosso Senhor claramente não pretendeu que seus
discípulos e seguidores construíssem suas casas espirituais em tal fundamento instável.
[Topo]
CRISTO NOS FALA PARA SUBMETERMO-NOS À AUTORIDADE
DA IGREJA
Em Mt 18,15-18 vemos Cristo orientar seus discípulos
em como corrigir um companheiro. É dito neste exemplo que Nosso Senhor identifica
melhor a Igreja que as Escrituras como sendo a autoridade final a se apelar. Ele
mesmo diz que se o irmão pecador não ouvir a própria Igreja, seja para ti como o pagão e o coletor de impostos (v.17) - isto é, como um excluído. Além do mais, Nosso
Senhor reenfatiza solenemente a autoridade infalível da Igreja no v.18 repetindo
Seu pronunciamento anterior sobre o poder de ligar e desligar (Mt 16,18-19), dirigido
desta vez aos apóstolos como um colégio, um grupo, e não somente a Pedro: Em verdade eu vos declaro: tudo o que ligares na
terra será ligado no céu, e tudo o que desligares na terra será desligado no céu
(Mt 18,18).
Claro que existem exemplos na Bíblia onde Nosso Senhor
apela às Escrituras, mas nestes casos Ele, como aquele que possui a autoridade, estava ensinando as Escrituras; Ele não estava permitindo que
as Escrituras ensinassem a si mesmas. Por exemplo, Ele preferiu responder
aos escribas e fariseus usando as Escrituras precisamente porque estes tentavam
apanhá-lo usando as mesmas Escrituras. Nestes exemplos, Jesus geralmente demonstra
como os escribas e fariseus tinham más interpretações, então corrigia-os mediante
uma melhor interpretação escriturística.
Suas ações não servem de argumento para que a Escritura
seja Sola, ou uma autoridade por si mesma
e, de fato, a única autoridade do cristão. Muito pelo contrário: em todo lugar que
Jesus leva seus ouvintes às Escrituras, Ele também fornece o Seu entendimento infalível,
uma interpretação com autoridade, demonstrando que as Escrituras não podem interpretar a si mesmas.
A Igreja Católica prontamente reconhece a inerrância
e autoridade da Escritura. Porém a doutrina católica diz que a regra imediata de
fé dos cristãos é a autoridade do ensino da Igreja - uma autoridade para ensinar
e interpretar a Escritura e a Tradição, como mostra
Mt 18,17-18.
Também deve-se notar que está implícita (ou talvez
até explícita) nesta passagem de Mateus o fato de que a Igreja deve ser visível, uma entidade palpável estabelecida sob
uma linha hierárquica. De outro modo, como alguém saberia a quem encaminhar o pecador?
Se a definição protestante de igreja fosse correta, então o pecador
deveria escutar todos os cristãos que existem, desejando que haja uma unanimidade
entre eles acerca do objeto da discussão. Transborda aos olhos o absurdo que esta
interpretação causaria. O único modo de tornar a afirmação de Nosso Senhor plausível
é reconhecendo que lá havia uma organização definida, com ofícios hierárquicos definidos,
a quem um apelo poderia ser feito e de onde um julgamento decisivo poderia ser dado.
[Topo]
A ESCRITURA AFIRMA QUE É INSUFICIENTE COMO ORIENTADORA
A Bíblia mostra em 2 Tm 3,17 que o homem de Deus é perfeito, qualificado para qualquer boa
obra. Como percebemos acima, este versículo prova somente que o homem de Deus
é plenamente suprido com as Escrituras; isto não é garantia de que ele automaticamente
saiba como interpretá-la da maneira correta. Este versículo chama a atenção à suficiência material das Escrituras, uma opinião que alguns pensadores
católicos sustentam atualmente.
Suficiência material significaria que a Bíblia de certo modo contém todas
as verdades que o cristão precisa saber; em outras palavras, os materiais estão todos presentes ou no mínimo implícitos. Suficiência formal, por outro
lado, significaria que a Bíblia não somente contém todas as verdades que são necessárias,
mas que ela também apresenta estas mesmas verdades e um sentido perfeitamente claro
e de pronto entendimento. Em outras palavras, estas verdades estariam em uma forma
prática tamanha que não haveria necessidade de uma Sagrada Tradição para clarificar
e complementar o entendimento da Palavra de Deus com uma interpretação infalível.
Devido a Igreja Católica afirmar que a Bíblia não
é suficiente por si mesma, naturalmente ensina que esta necessita de um intérprete.
São duas as razões pelas quais a Igreja ensina tal coisa: primeiro, porque Cristo estabeleceu uma Igreja viva para ensinar
com Sua autoridade. Ele simplesmente não deu uma Bíblia aos seus discípulos, completa
e encadernada, e lhes disse para ir e fazer cópias para a multidão, para distribuir,
e deixar que cada um interprete-a do seu jeito. Segundo, a própria Bíblia afirma que precisa de um intérprete.
Sobre a segunda assertiva, lemos em 2 Pd 3,16 que São Paulo escreveu passagens difíceis, cujo sentido pessoas ignorantes e sem formação deturpam,
como também fazem para as demais Escrituras, para a própria condenação.
Neste único versículo podemos ver três pontos muito
importantes sobre a Bíblia e sua interpretação: a) A Bíblia contém passagens que
não são facilmente compreendidas ou suficientemente claras, um fato que demonstra
a necessidade de um orientador infalível e com autoridade suficiente para tornar
as passagens claras e compreensíveis [8], b) não é somente possível que algumas
pessoas deturpem o significado da Escritura, mas isto, de fato, já
estava sendo feito desde o começo da era da Igreja, c) distorcer o significado da
Escritura pode resultar na condenação de um indivíduo, realmente um destino desastroso.
É óbvio destas considerações que Pedro não acredita que a Bíblia deva ser a única
regra de fé. Mas há mais.
Em At 8,26-40 lemos o encontro do diácono Felipe
com o eunuco etíope. Neste cenário, o Espírito Santo leva Felipe a se aproximar
do etíope. Quando Felipe percebe que o etíope está lendo o profeta Isaías, faz uma
importante pergunta: será que compreendes verdadeiramente
o que está lendo? Mais importante é a resposta dada
pelo eunuco: e como poderia eu compreender,
respondeu ele, se não tenho guia?
Mesmo que este Felipe (conhecido como o Evangelista) não seja um dos apóstolos, ele fora comissionado
pelos apóstolos (cf. At 6,6) e pregou o Evangelho com autoridade
(cf. At 8,4-8). Consequentemente, sua pregação
refletiria o legítimo ensino dos apóstolos. A questão aqui é que as declarações
do etíope verificam o fato de que a Bíblia não é suficiente por si mesma como orientadora
de doutrina cristã, e as pessoas que ouvem a Palavra precisam de uma autoridade
que as oriente corretamente para que possam entender o que a Bíblia quer dizer.
Se a Bíblia fosse de fato suficiente por si mesma, então o eunuco compreenderia
claramente a passagem de Isaías.
Também há 2 Pd 1,20, que afirma: nenhuma profecia da Escritura
é objeto de interpretação pessoal. Aqui vemos a própria Bíblia afirmar de forma inequívoca que suas profecias
não são objeto pelos quais o indivíduo deva compreender pelos seus próprios meios.
Também é de grande importância que este verso seja precedido por uma seção sobre
o testemunho apostólico (vv.12-18) e seguido por uma seção sobre falsos mestres
(2,1-10). Pedro está contrastando o ensino apostólico genuíno com os falsos profetas
e falsos mestres, e faz a referência à interpretação pessoal como o pivô entre os
dois. A implicação imediata e clara é que a interpretação pessoal é um caminho por
onde o indivíduo perde-se do autêntico ensino dos apóstolos e passa a seguir falsos
mestres.
[Topo]
OS PRIMEIROS CRISTÃOS NÃO TINHAM UMA BÍBLIA COMPLETA
Estudiosos bíblicos nos revelam que o último livro
da Bíblia não havia sido escrito até o final do primeiro século, isto é, até meados
do ano 100 d.C. [9]. Este fato demonstra um intervalo inexato de cerca de 65 anos
entre a ascensão de Cristo aos céus e o término da redação da Bíblia como a conhecemos.
A pergunta que deve ser feita é a seguinte: Quem ou o quê serviu como autoridade final e infalível durante este tempo?
Se a doutrina protestante da Sola Scriptura fosse verdade, então houveram disputas e discussões dentro das comunidades
que não tiveram a oportunidade de ser resolvidas definitivamente, até que os livros
do Novo Testamento fossem escritos, mesmo já existindo uma Igreja antes que a Bíblia
estivesse completa. O barco ficou sem comandante, por assim dizer, pelo menos por
um determinado tempo. Porém isto vai de encontro às afirmações e promessas que Jesus
fez à sua Igreja: Eis que estarei convosco todos
os dias, até a consumação dos tempos (Mt 28,20), sem mencionar que Ele garantiu a seus discípulos: não vos deixarei órfãos (Jo 14,18)
Este é um assunto de particular importância, pois
as primeiras décadas da existência da Igreja foram repletos de tumultos. As perseguições
já haviam começado, cristãos estavam sendo martirizados, a nova fé estava lutando
para crescer, e alguns falsos mestres já haviam aparecido (cf. Gl 1,6-9). Se a Bíblia
fosse a única regra de fé dos cristãos, sendo que ela ainda não havia tomado forma
- muito menos definido seu cânon - durante pelo menos 65 anos depois da ascensão
de Jesus, como a Igreja primitiva poderia resolver questões doutrinárias sem uma
autoridade que a conduzisse?
Neste momento os protestantes buscam oferecer duas
possíveis respostas: 1) Os apóstolos eram temporariamente a última autoridade enquanto
o Novo Testamento estava sendo escrito, e 2) que o Espírito Santo foi dado à Igreja
e que a sua direta orientação foi o que preencheu o lacuna entre a ascensão e a
definição do Novo Testamento.
Sobre a primeira resposta, é verdadeiro que Jesus
revestiu aos apóstolos da Sua autoridade; contudo, a Bíblia em local algum indica
que esta autoridade dentro da Igreja iria cessar com a morte dos apóstolos. Pelo
contrário, a Bíblia é bastante clara quando: 1) em lugar algum diz que uma vez morto
o último apóstolo, a Palavra de Deus escrita tornar-se-ia a autoridade final e;
2) os apóstolos claramente escolheram sucessores que, por sua vez, possuíram a mesma
autoridade de ligar e desligar. A substituição de Judas Iscariotes por Matias (cf. At 1,15-26) e a transmissão da autoridade apostólica de Paulo
a Timóteo e Tito (cf. 2 Tm 1,6; Tt 1,5) são exemplos de sucessão apostólica.
Sobre a segunda resposta - que o auxílio direto do
Espírito Santo preencheu a lacuna - o problema com este entendimento é que o auxílio
direto do próprio Espírito Santo é uma conclusão extrabíblica. Naturalmente, a Bíblia
nos fala da clara presença do Espírito Santo entre os cristãos e sua missão de ensinar
aos apóstolos toda a verdade, porém se a direção direta do Espírito Santo foi, de fato,
a autoridade final durante estes 65 anos, então a história da Igreja conheceu duas
autoridades finais sucessivas: primeiro, o Espírito Santo, sendo que esta autoridade
foi substituída pela Escritura, que então tornar-se-ia sola, ou a única autoridade final. E se esta situação
de uma autoridade final extrabíblica é permissiva pelos protestantes, não o é pelos
católicos, que afirma que a autoridade do ensino da Igreja é a autoridade final
direta - derivando sua autoridade de Cristo e seu ensino da Escritura e da Tradição,
guiada pelo Espírito Santo.
O Espírito Santo foi dado à Igreja por Jesus Cristo,
e é exatamente este mesmo Espírito que protege o chefe visível da Igreja, o Papa,
e a autoridade do ensino da Igreja jamais permitindo que ele ou ela caiam em erro.
O católico acredita que Cristo de fato enviou seu Espírito Santo à Igreja e que
este Espírito esteve sempre presente na Igreja, ensinando toda a verdade (Jo 16,13) e
continuamente protegendo sua integridade doutrinal, particularmente pelo ofício
do Papa. Com isso o Evangelho pode continuar sendo pregado - com autoridade e infalivelmente
- mesmo sem um só versículo do Novo Testamento.
[Topo]
A IGREJA PRODUZIU A BÍBLIA, E NÃO O CONTRÁRIO
A doutrina da Sola Scriptura não dá importância - ou pelo menos grosseiramente desmerece - ao fato de
que a Igreja surgiu antes da Bíblia, e não o contrário. Foi a Igreja, com efeito,
que escreveu a Bíblia sob a inspiração do Deus todo-poderoso: os israelitas como
a Igreja do Antigo Testamento (ou pré-católicos) e os católicos da Igreja do Novo Testamento.
Nas passagens do Novo Testamento notamos que Nosso
Senhor dá certa primazia à autoridade do ensino de Sua Igreja e sua proclamação
em Seu nome. Por exemplo, em Mateus 28,20 vemos Jesus ordenando os apóstolos a ir
e ensinar em Seu nome, fazendo discípulos em todas as nações. Em Marcos 16,15 vemos
que os apóstolos são enviados a pregar a todo o mundo. E em Lucas 10,16 vemos que
aquele que escuta os setenta e dois escuta o Senhor. Estes fatos são muito importantes, pois em lugar algum vemos Nosso Senhor ordenando
que seus apóstolos evangelizem o mundo escrevendo em Seu nome. A ênfase está sempre na pregação
do Evangelho, não na sua impressão e distribuição escrita.
Então segue que o comando e a autoridade do ensino
da Igreja são elementos indispensáveis como meios pelos quais a mensagem do Evangelho
deve alcançar os confins do mundo. Pelo fato de a Igreja ter escrito a Bíblia, é
lógico e racional dizer que somente a Igreja detém a autoridade para interpretá-la
e aplicá-la. E sendo assim, por causa de sua natureza e origem, a Bíblia não pode
servir como única regra de fé para os fiéis cristãos. Em outras palavras,
por ter produzido a Escritura, a Igreja não elimina a necessidade de ela mesma servir
como mestre e intérprete destas Escrituras.
Além do mais, não é errado dizer que somente por
colocar a autoridade apostólica no papel, a Igreja de alguma forma faz com que esta
mesma autoridade seja superior ao ensino oral? Semelhantemente à organização que
Nosso Senhor estabeleceu, Sua palavra é autoridade, mas porque esta palavra está
posta em uma forma diferente da outra não significa que uma forma seja superior
à outra. Pelo fato de a única Palavra de Deus ser dimórfica em sua organização, negar a autoridade de uma é negar a autoridade da outra.
As formas da Palavra de Deus são complementares, não excludentes. Portanto, se há
necessidade das Escrituras, também há necessidade da autoridade que a produziu.
[Topo]
É COMPLETAMENTE ESTRANHA À IGREJA PRIMITIVA
A idéia da autoridade da Escritura existindo separada
da autoridade do ensino da Igreja é completamente estranha à Igreja Primitiva
Se buscarmos os escritos dos Pais da Igreja Primitiva,
encontraremos referências à Sucessão Apostólica [10], aos bispos como guardiões
do Depósito da Fé [11], e ao primado e autoridade de Roma [12]. O precioso valor
destas referências torna claro o fato de que a igreja primitiva entendeu a si própria
como uma hierarquia necessária para proteger a integridade da fé. Em lugar algum
encontramos alguma indicação de que os primeiros fiéis cristãos discordavam da autoridade
da Igreja e a consideravam inválida como regra de fé. Do contrário, vemos nestes
escritos que a Igreja, desde a sua mais longínqua origem, entendeu sua autoridade
para ensinar como uma combinação inseparável entre Escritura e Tradição Apostólica
- sendo ambas ensinados e interpretados com autoridade pelo Magistério da Igreja,
cuja cabeça é o bispo de Roma.
Dizer que a Igreja primitiva acreditava na noção
de somente a Bíblia, seria o mesmo que dizer que
homens e mulheres poderiam alegar que as leis civis não necessitam de um Congresso
que as legisle, ou de uma corte que as interprete e de polícia alguma que as execute.
Tudo que seria necessário seria o livro de Direito Civil em todas as casas para
que cada cidadão possa determinar por si mesmo como entender e aplicar as leis.
Tal afirmação, claro, é absurda, pois ninguém esperaria que as leis civis funcionassem
bem deste modo. A consequência de tal escândalo inadvertidamente levaria à anarquia
total.
Quão mais absurdo, então, é pretender que a Bíblia
pode funcionar por si mesma sem a Igreja que a organizou? É somente esta Igreja
- e não somente qualquer cristão - que possui a autoridade divinamente transmitida
para a interpretar corretamente, assim como legislar sobre os problemas decorrentes
da conduta de seus membros. Se este não fosse o caso, qualquer nível de situação
- local, regional ou global - rapidamente desenvolver-se-ia em anarquia espiritual,
onde cada cristão pode formular um sistema teológico e desenvolver uma moral simplesmente
baseadas em sua própria interpretação da Bíblia.
E desde a tão chamada Reforma não é isto que estamos vendo? De fato, um exame do escândalo na Europa que
imediatamente seguiu a gênese da reforma - particularmente na Alemanha - irá demonstrar
que o resultado das doutrinas da reforma são uma desordem tanto espiritual quanto
social [13]. Mesmo Lutero se mostrou desapontado pelo fato de que infelizmente, é de nossa costumeira observação que
agora sob o Evangelho o povo está mais amargo, invejoso e avarento que antes sob
o papado [14].
[Topo]
OS HERESIARCAS BASEIAM-SE NA INTERPRETAÇÃO SEM
O MAGISTÉRIO
Os heresiarcas e os movimentos heréticos baseiam
suas doutrinas na interpretação da Bíblia separada do Magistério e da Tradição.
Ao longo da história da Igreja primitiva, vemos que
ela lutou continuamente contra as heresias e contra quem as promovia. Vários foram
os concílios que responderam aos desafios dos detratores [15] e recorreram à Roma
para dar um fim às disputas doutrinárias e disciplinares. Por exemplo, o Papa Clemente
interveio em uma discussão na comunidade de Corinto no fim do primeiro século e
acabou com um cisma por lá. No segundo século, o Papa Vitor excomungou uma grande
parte da Igreja no Oriente por motivos de divisões sobre quando a páscoa deveria
ser celebrada. No início do século três, o Papa Calixto condenou a heresia sabeliana.
Nestes casos, quando estas heresias ou conflitos
disciplinares ocorrem, as pessoas envolvidas defendem seus erros através de sua
própria interpretação das Escrituras, excluindo a participação da Tradição e do
Magistério da Igreja. Um bom exemplo disto é o caso de Ário, sacerdote do quarto
século que declarou que o Filho de Deus era uma criatura e não cosubstancial ao
Pai.
Ário e todos os seus seguidores citavam versículos
da Bíblia para provar seus argumentos [15]. Os debates que chegaram por causa desta
doutrina tornaram-se tão volumosos que foi convocado o primeiro Concílio Ecumênico,
em Nicéia, em 325 d.C. O Concílio, sob a autoridade do Papa, declarou serem as doutrinas
arianas heréticas e elaborou declarações definitivas quanto à pessoa de Jesus, e
fez isso baseado no que a Sagrada Tradição tinha a dizer sobre os versículos bíblicos
em questão.
Aqui vemos a autoridade da Igreja sendo utilizada
como última e extremamente importante palavra em matéria doutrinária. Caso não existisse
autoridade alguma a quem apelar, a heresia de Ário poderia ter se apossado da Igreja.
A maioria dos bispos daquela época foi seduzida pela heresia ariana [17]. Apesar
de Ário ter fundamentado sua doutrina nas Escrituras - e provavelmente comparou a Escritura pela Escritura - o fato é que chegou a uma conclusão herética. Foi
somente a autoridade do ensino da Igreja - hierarquicamente constituída - que o
freou e declarou que estava errado.
A implicação é óbvia. Se você perguntar a algum protestante
se Ário estava ou não correto em sua doutrina de que o Filho fora criado, ele irá,
claro, responder que não. Enfatize, então, que mesmo que ele tenha utilizado as Escrituras pelas Escrituras, mesmo assim ele chegou a uma
conclusão errada. Se isto foi verdadeiro para Ário, o que garante ao protestante
que este não é o caso acerca de sua interpretação de uma dada passagem
bíblica? O fato de os protestantes reconhecerem que a interpretação de Ário estava
errada implica dizer que de fato houve uma base bíblica para seus argumentos. Este fato,
portanto, transforma-se em um questionamento acerca do que seja uma verdadeira interpretação
bíblica. A única explicação possível é que deve haver, por necessidade, uma autoridade
infalível que no-la diga. Esta autoridade infalível, a Igreja Católica, declarou
Ário um herege. Se a Igreja Católica jamais foi infalível ou possuiu alguma autoridade
em suas declarações, então os cristãos não teriam razão alguma em rejeitar Ário
e aceitar a autoridade da Igreja, e a maioria do cristianismo atual seria baseado
nos ensinamentos de Ário.
É evidente, portanto, que usar somente a Bíblia não
é garantia de se chegar a uma doutrina verdadeira. O resultado acima descrito é
o que acontece quando a falsa doutrina da Sola Scriptura é utilizada como princípio guia, e a história da Igreja e das inúmeras heresias
que teve de combater são testemunhas inegáveis deste fato.
[Topo]
O CÂNON DA BÍBLIA NÃO ESTAVA FORMADO ATÉ O SÉCULO
4
Um dos fatos históricos que é um extremo inconveniente
aos protestantes é o fato de que o cânon da Bíblia - a lista sagrada dos livros
que fazem parte das Escrituras inspiradas - não fora definido até o final do século
4. Até esta data, havia larga discórdia sobre quais seriam os livros considerados
inspirados e de origem apostólica. O cânon bíblico antigo variava de local a local:
algumas listas continham livros que mais tarde foram reconhecidos como apócrifos,
enquanto outras listas não traziam livros que hoje constam entre os livros canônicos.
Por exemplo, existiam livros cristãos que eram considerados por alguns inspirados
e apostólicos e que eram lidos nos cultos públicos, mas que foram mais tarde omitidos
do Novo Testamento, entre eles, O Pastor de Hermas, Epístola de Barnabé, Didaché [18].
Somente nos Concílio de Roma (382), Hipona (393)
e Cartago (397) podemos encontrar uma lista definitiva dos livros canônicos sendo
descrita, e cada um destes concílios reconheceu a mesma lista do anterior [19].
A partir de então, não houveram mais disputas sobre o cânon bíblico, a única exceção
ficando a cargo dos reformadores protestantes, que entraram em cena em 1517, inacreditáveis 11 séculos depois.
Mais uma vez, mais duas questões fundamentais porque
alguém não deve buscar respostas que sejam consoantes com a Sola Scriptura: a) Quem ou o quê serviu como autoridade cristã final
durante o tempo em que o Novo Testamento não tomou forma? b) E se havia alguma autoridade
final que os protestantes reconhecem antes da definição do cânon, com que base esta
autoridade desapareceu uma vez que o cânon bíblico tenha sido fechado?
[Topo]
O CÂNON FOI DEFINIDO POR UMA AUTORIDADE "EXTRA-BÍBLICA"
Devido a Bíblia não vir com um índice inspirado,
a doutrina da Sola Scriptura criou um outro dilema: como alguém pode saber quais são os livros que pertencem à Bíblia - principalmente,
ao Novo Testamento? Um fato inquestionável é que ninguém
pode saber disso, a menos que alguma coisa fora da Bíblia mostre a resposta. E sem
dúvida, este detalhe a mais deve ser, por necessidade, infalível, pois a possibilidade
haver erro na definição dos livros inspirados [20] significa que todos os cristãos
estariam correndo o risco de estar lendo livros não inspirados, uma situação que
tornaria a Sola Scriptura defeituosa. Porém, se houve tal autoridade "extrabíblica",
a doutrina da Sola Scriptura desaba da mesma forma.
Outro fato histórico que dificulta ainda mais a aceitação
desta doutrina é que não houve qualquer outra instituição que tenha identificado
e ratificado o cânon da Bíblia. Os três Concílios mencionados anteriormente, todos,
eram concílios católicos. A Igreja Católica deu a sua definição final do cânon da
Bíblia no Concílio de Trento em 1546 - nomeando os mesmos 73 livros que já haviam
sido incluídos desde o século 4. Se a Igreja Católica é capaz, então, de conceder
uma definição autoritária e infalível de tão importante assunto sobre quais livros
deve conter a Bíblia, logo com que bases alguém pode questionar sua autoridade em
outros assuntos acerca de fé e moral?
Os protestantes, no mínimo, devem, assim como o seu
fundador, Martinho Lutero, reconhecer que a Igreja Católica protegeu e organizou
a Bíblia: Somos obrigados a reconhecer
muitas coisas aos católicos - (como por exemplo), que eles possuem a Palavra de
Deus, que nós recebemos deles; de outro modo, não saberíamos nada sobre ela [21].
[Topo]
CRER QUE A BÍBLIA É "AUTO-AUTENTICÁVEL"
NÃO TEM BASE
Procurando uma resposta satisfatória ao problema
de como fora determinado o cânon bíblico, os protestantes costumeiramente apelam
para o fato de que a Bíblia é auto-autenticável, ou seja, os próprios livros da Bíblia testemunham
que eles são inspirados. O grande problema com esta afirmação é que uma boa excursão
pela história da Igreja demonstra que esta teoria é falha.
Por exemplo, vários livros do Novo Testamento - Tiago, Judas, 2 Pedro, 3 João e Apocalipse - receberam questionamentos acerca de seu status canônico
por algum tempo. Em alguns lugares eram aceitos, enquanto simultaneamente em outros
eram rejeitados. Mesmo grandes pensadores, como Santo Atanásio (297-373), São Jerônimo
(342-420) e Santo Agostinho (354-430) apresentaram listas de livros do Novo Testamento
que refletiam o que era reconhecido como inspirado em seus tempos e lugares, porém
nenhuma destas listas correspondia ao Novo Testamento que fora identificado pela
Igreja Católica no fim do século 4 e que até hoje corresponde à Bíblia que os católicos
possuem [22].
Se a Bíblia é auto-autenticável, porque, então, havia tamanha discórdia e incerteza
sobre tantos livros? Porque a disputa? Porque o cânon não foi identificado logo
do início, já que os livros são prontamente discerníveis? A única resposta a estes
questionamentos é que o cristão deve aceitar que a Bíblia não seja auto-autenticável.
Mais interessante também é o fato de que alguns livros
da Bíblia não identificam seu próprio autor. A idéia de auto-autenticação - se fosse
verdade - seria mais plausível se cada um dos autores bíblicos identificassem a
si mesmos, pois examinaríamos mais facilmente suas credenciais, ou, no mínimo, quem
era que alegava falar em nome de Deus. Mas quanto a isso a Bíblia nos deixa ignorantes,
com poucos exemplos.
Tome o Evangelho de Mateus como exemplo: não há indicação
de que fora Mateus, o cobrador de impostos, quem o escreveu. Há duas possibilidades,
então, para conhecermos o autor deste livro: 1) através da Tradição; 2) por estudiosos
bíblicos. Em ambos os casos, a fonte da conclusão é "extrabíblica", e,
portanto, condena a doutrina da Sola Scriptura à completa incompetência e fracasso.
Mas os protestantes respondem a este argumento dizendo
que não é necessário conhecer se Mateus escreveu ou não este Evangelho, pois a salvação
não depende de conhecer se foi ele ou outro quem o escreveu. Porém, tal ponto de
vista guarda uma dificuldade. O que os protestantes estão dizendo é que, enquanto
um Evangelho autêntico é a Palavra de Deus e é o meio pelo qual o cristão adquire
um conhecimento salvífico de Jesus Cristo, o mesmo cristão não tem como saber com
certeza, no caso do Evangelho de Mateus, se este é de origem apostólica e, consequentemente,
não possui meios para saber se este Evangelho é autêntico (ou seja, a Palavra de
Deus) ou não. E se a autenticidade deste Evangelho é questionável, então porque
está incluído na Bíblia? Se sua autenticidade é certa, como se pôde saber com a
ausência do autógrafo de Mateus? A única saída coerente é admitir que a Bíblia não
é auto-autenticável.
O protestante então recorrerá à asserção bíblica
de auto-inspiração, citando a passagem de 2 Tm 3,16 - Toda Escritura é inspirada por Deus, e útil... - Contudo, a alegação de inspiração
não é por si só garantia de inspiração. Considere o fato de que os escritos de Mary
Baker Eddy, a fundadora da seita Ciência Cristã, aleguem ser inspirados. Os escritos de Joseph Smith,
o fundador da seita Mórmon, afirmem ser inspirados. São apenas dois exemplos, entre
muitos, que demonstram que qualquer escrito particular pode reclamar a autoridade
sobre qualquer coisa. Obviamente, para reconhecermos se um escrito é inspirado de
verdade ou não necessitamos mais do que tal afirmação escrita no papel. A garantia
de inspiração de algum escrito deve vir de fora deste escrito, senão será um eterno
argumento circular. No caso da Bíblia, a garantia deve vir de uma fonte fora da
Bíblia. Porém, a autenticação extrabíblica é uma possibilidade excluída pela Sola Scriptura.
[Topo]
NENHUM DOS ESCRITOS BÍBLICOS ORIGINAIS EXISTE
MAIS
Uma importante consideração - talvez uma das mais
fatais à doutrina da Sola Scriptura - é a de que não possuímos ao menos um manuscrito original de nenhum livro
da Bíblia. Claro que existem milhares de manuscritos que são cópias dos originais - e mais provável é que sejam cópias das cópias -, e este fato em nada auxilia a Sola Scriptura pela simples razão de que sem os originais, ninguém pode garantir que possuímos
atualmente a Bíblia real, completa e sem corrupções [23]. Os autógrafos originais
são inspirados, as cópias não...
Os protestantes argumentam que não há problema em
não ter os escritos originais, pois Deus protegeu a Bíblia protegendo sua duplicação
ao longo dos séculos [24]. Entretanto, existem dois problemas com esta linha de
pensamento. Primeiro, que afirmar que a providência
de Deus manteve a integridade das cópias é afirmar algo que não encontra nem de
longe suporte nas Escrituras, logo não pode ser tomada como regra de fé, pela própria
definição de Sola Scriptura. Em outras palavras, não se encontra
versículo algum que demonstre que Deus protegeria a transmissão dos manuscritos,
logo esta conclusão está excluída. A Bíblia nada diz a respeito.
Segundo, se você afirmar que Deus protegeu a transmissão da Sua Palavra escrita,
então podemos concluir que também protegeu a transmissão de Sua Palavra oralmente (releia 2 Ts 2,15 e a dimórfica estrutura da Palavra de Deus). Até porque
a pregação do Evangelho começou pela Tradição Oral (cf. Lc 1,1-4 e Rm 10,17). Somente muito tempo depois
uma parte da Tradição oral fora posta na forma Escrita - tornando-se a Sagrada Escritura
- e somente muito tempo após este mesmo evento os escritos foram reconhecidos e
definidos com canônicos. Uma vez que você possa reconhecer que Deus protegeu a transmissão
oral de Sua mensagem, você automaticamente admite as bases da Sagrada Tradição e
já começou a compreender a posição católica.
[Topo]
OS MANUSCRITOS BÍBLICOS POSSUEM MILHARES DE VARIAÇÕES
Percebeu-se que, existindo milhares de manuscritos
da Bíblia, estes manuscritos continham milhares de variações textuais; um autor
estima que devam existir mais de 200.000 variações [25]. Apesar de muitas destas
variações referirem-se a temas menores - tais como escrita, ordem das palavras e
etc. - também existem variações das mais importantes naturezas: a) os manuscritos
demonstram que algumas vezes os escribas modificavam o texto para harmonizar passagens,
acomodá-las a fatos históricos, e para estabelecer uma correta conduta doutrinária
[26]; b) existem partes de versículos (isto é, mais que simples palavras) que possuem
leitura diferente em diferentes manuscritos, como Jo 7,39, At 6,8, Cl 2,2 e 1 Ts 3,2 [27]. Estes fatos levam o protestante
a não saber se a Bíblia que possui é a mesma Bíblia que foi escrita pelo autor inspirado.
E se este é o caso, então como o protestante pode professar a base de sua crença
somente na Bíblia quando ele não consegue determinar com certeza a autenticidade
textual desta mesma Bíblia? [28].
Mais importante, existem muito mais variações entre
os manuscritos do Novo Testamento. Os dois exemplos seguintes ilustrarão este ponto:
Primeiro, de acordo com os manuscritos que possuímos, existem quatro possíveis finais
para o Evangelho de Marcos: o menor, que inclui os vv.1-8 do capítulo 16, o longo, que inclui os vv.1-8 mais os vv.9-20; o intermediário, que inclui duas ou três linhas entre o v.8 e o final longo, e o final longo expandido, que inclui vários versículos após o v.14 do final longo [29]. O melhor que podemos concluir sobre estas diferenças é que não podemos
saber, apenas pela Bíblia, onde termina o Evangelho de Marcos, e, dependendo de
qual final está (ou estão) incluído(s) na Bíblia protestante, o publicador corre
o risco de estar distribuindo Bíblias acrescentando ou omitindo versículos do texto
original - portanto violando a doutrina da Sola Scriptura, que requer que somente a Bíblia, e a Bíblia inteira seja a única regra de fé. Mesmo se uma Bíblia protestante incluir todos os
quatro finais com notas de rodapé e comentários, mesmo assim não terão a certeza
de qual final é o genuíno.
Segundo, há algumas evidências para leituras alternadas de alguns textos centrais
da Bíblia, tal como Jo 1,18, onde ocorrem dois possíveis significados [30]. Algumas Bíblias (como a King James Version) trazem este versículo como está
na Douay-Rheims: Nenhum homem viu a Deus em qualquer tempo, o filho único que está no seio
do Pai o revelou. Outras acompanham a New Internacional Version: Ninguém jamais viu Deus. O Filho único, que está à direita do Pai, foi quem
o revelou. Ambas as formas estão sustentadas por manuscritos, e você encontrará exegetas
bíblicos debruçarem seus mais preciosos julgamentos à que creem seja a "correta".
Uma situação similar ocorre em At 20,28, onde os manuscritos mostram que Paulo poderia estar se referindo tanto
à Igreja do Senhor (gr. Kurion) ou à Igreja de Deus (gr. Theou) [31].
Este assunto pode parecer simplório à primeira vista,
mas suponha que você esteja tentando evangelizar um membro de uma seita que nega
a divindade de Jesus Cristo. Ainda que Jo 1,18 e At 20,28 não sejam as únicas passagens
que possam defender a divindade de Nosso Senhor, você ficará incapacitado de utilizá-los
com esta pessoa, dependendo de qual manuscrito sua Bíblia foi reproduzida. Isto
levaria-o a uma possibilidade reduzida de defender uma doutrina bíblica fundamental,
e este fato tornaria problemática a perspectiva da doutrina da Sola Scriptura.
[Topo]
EXISTEM CENTENAS DE VERSÕES BÍBLICAS
Como mencionado no tópico anterior, existem milhares
e milhares de variações nos manuscritos bíblicos. Acrescentado a isto o fato de
histórico de que existiram centenas de versões bíblicas, variando cada uma tanto
em tradução quanto em fontes textuais. A questão é: qual é a versão correta? ou qual é a versão mais fidedigna ao original? A possível resposta dependerá de qual lado você estiver,
ou de católicos ou de protestantes. Outra saída dependerá de qual especialista bíblico
você depositará sua confiança e credibilidade.
É fato que algumas versões são inferiores a outras.
Os avanços nos campos arqueológicos possibilitaram descobertas (como os manuscritos
do Mar Morto) que alteraram nosso conhecimento sobre locais e linguagens bíblicas
antigas. Sabemos mais hoje pelos avanços dos estudos bíblicos que nossos antepassados
de 100, 200, 1000 anos atrás. Deste ponto de vista, versões bíblicas contemporâneas
provavelmente possuem certa superioridade em relação às suas versões mais antigas.
Por outro lado, Bíblias transcritas a partir da Vulgata latina de São Jerônimo (quarto
século) - em língua inglesa, a Douay-Rheims - são baseadas em textos originais que
não existem mais, portanto estas versões passaram por dezesseis séculos de possíveis
corrupções.
Isto causa um problema considerável aos protestantes,
pois significa que os protestantes modernos possuem, por assim dizer, uma versão
bíblica melhor ou mais acurada que a Bíblia de seus antecessores,
que, portanto, possuíram Bíblias de menor qualidade - que por sua vez leva a concluir
que os protestantes modernos possuem uma bíblia "mais completa" como autoridade final que a bíblia "menos completa" que dos antigos protestantes. Só que esta discrepância entre autoridades começa a diminuir a doutrina da Sola Scriptura, pois esta significa que uma bíblia não é mais ou
menos autoritária que outra, e se uma não é autêntica e completa, a probabilidade
de produzir doutrinas erradas é imensa, logo a função particular da bíblia como
autoridade final falha, pois não pode mais ser uma autoridade final.
Outro ponto a considerar é que traduções bíblicas,
como produtos humanos, não são completamente objetivas e imparciais. Um pode se
sentir mais à vontade de incluir notas a uma passagem de uma maneira que corresponda
melhor à doutrina que deseja transmitir. Um exemplo disto é a ocorrência da palavra
grega paradoseis nas bíblias protestantes. Como negam a existência
da Sagrada Tradição, algumas traduções trazem esta palavra como ensinamentos ou
costumes e não tradições, sendo que esta última é a que mais se encaixa na tradução
correta e com a posição católica.
Ainda outra consideração é que algumas versões são
corrupções bíblicas notáveis, como é o caso da Bíblia dos Testemunhas de Jeová,
a New World Translation. Nela os "tradutores"
manusearam passagens bíblicas para propagar doutrinas erradas [32]. Agora, a menos
que haja uma autoridade fora da Bíblia para declarar tais traduções como falsas
e perigosas, com qual autoridade e revelação divina os protestantes podem considerar
esta ou aquela tradução como falsa? Com qual autoridade os protestantes podem impedir
os Testemunhas de usar esta tradução para difundir suas doutrinas? Os protestantes
responderiam que este caso pode ser encontrado na Bíblia, através dos estudos de
pesquisadores bíblicos. Contudo isto ignora o fato dos Testemunhas também basearem sua tradução em estudos "especialistas". Forma-se um jogo
de vai-e-volta, colocando as conclusões de um especialista contra outro, uma autoridade
humana contra outra.
Este problema somente pode ser resolvido pela intervenção
de um magistério infalível e com autoridade de falar por Cristo. O católica sabe
que esta autoridade é a Igreja Católica e a autoridade de seu magistério. No exercício
desta autoridade, os bispos católicos conferem o imprimatur ("Imprima-se") que deve constar nas primeiras páginas de certas
versões bíblicas e outros tipos de literatura religiosa para alertar os leitores
que aquele livro não contém nada contrário ao ensinamento de Cristo ou dos apóstolos
[33].
[Topo]
A BÍBLIA NÃO ESTAVA DISPONÍVEL A TODOS ATÉ O SÉCULO
15
Essencial à doutrina da Sola Scriptura é a idéia de que o Espírito Santo guia cada crente na interpretação infalível
de qualquer passagem bíblica. Esta idéia, no mínimo, requer que todos possuam Bíblias
ou acesso a ela. A dificuldade de tal pensamento está no fato de que a Bíblia
não era um produto de massas disponível para todo mundo até o advento da
imprensa no século 15 [34]. Mesmo depois disso, custava certo tempo até que um
número ideal de Bíblias fosse impressa para suprir a população.
A difícil situação que esta idéia coloca é que
milhões e milhões de cristãos ficaram sem uma autoridade final até o século 15,
na total confusão espiritual, a menos que eles pudessem possuir uma Bíblia
manuscrita. Qualquer um consideraria Deus um tanto cruel por causa disto, pois
teria revelado sua mensagem de salvação para a humanidade por Cristo, mesmo
sabendo que esta mensagem não estaria disponível a esta mesma humanidade por
quinze séculos.
Porém sabemos que Deus não é cruel, mas tem um
amor infinito por nós. Por esta razão não nos deixaria na escuridão. Nos enviou
Seu único Filho para nos mostrar o Reino de Deus, como deveríamos agir e crer,
e este Filho estabeleceu uma Igreja para promover esses ensinos através da
pregação aos letrados e iletrados: assim a fé vem da pregação, e a pregação é o anuncio da Palavra de
Cristo (Rm 10,17). Cristo também deu
à Sua Igreja a garantia de que Ele sempre estaria com ela, nunca permitindo que
ensine o erro. Deus, por essa razão, não abandonou Seu povo e fez com que antes
da invenção da imprensa estes chegassem ao conhecimento de Seu Filho. De fato,
deu-nos um mestre infalível, obra divina, a Igreja Católica, para nos dar toda
a informação necessária sobre a Boa Nova - e da forma certa.
[Topo]
A Sola
Scriptura NÃO EXISTIA ANTES DO SÉCULO 14
É uma realidade dura, mas deve ser encarada
pelos protestantes, o fato de que esta doutrina não surgiu antes do século 14 e
não se difundiu antes do século 16 - um tempo longo, muito longo, desde a era
dos apóstolos e da fundação da Igreja de Cristo. Este fato, claro, é
simplesmente ignorado pelos protestantes, mas sozinho é razão para refutar a Sola Scriptura. Esta doutrina não existia antes de John Huss (precursor do protestantismo) no século 14 e somente ganhou difusão
quando Martinho Lutero, no século 16, veio trazer
suas "tradições de homens" para por no lugar da autêntica doutrina
cristã. Esta doutrina, portanto, não somente surgiu do nada, mas também
representa uma mudança abrupta e radical no ensino dos apóstolos.
Claro, os protestantes afirmam que a própria
Bíblia ensina a Sola Scriptura e por isso esta doutrina é tão antiga quanto a
Igreja. Contudo, como mostramos nos primeiros tópicos, a Bíblia não ensina esta
doutrina em lugar algum. A insistência nesta afirmação é uma tentativa de
forçar um contexto bíblico que mais se adeque ao que se pretende. Um exame
acurado da história revela se uma crença foi ou não originada por Jesus e pelos
apóstolos ou se apareceu em algum outro lugar no tempo. O fato é que, apesar
dos esforços protestantes, os registros históricos são silenciosos quanto à
doutrina da Sola Scriptura antes do 14º século.
[Topo]
PRODUZ MAUS FRUTOS, COMO DIVISÕES E DISPUTAS
Se esta doutrina fosse correta e santa, então
todos os protestantes deveriam concordar em todos os pontos doutrinários, pois
a Bíblia não pode ensinar doutrinas contraditórias simultaneamente. Mas a
realidade é que existem milhares [35] de seitas protestantes, cada uma
proclamando ser a Bíblia sua única regra de fé, cada uma garantindo que está
pregando a verdade do Evangelho, embora muitas preguem assuntos totalmente
diferentes umas das outras. Os protestantes, mestres da fuga, dizem que tais
doutrinas discordantes não são essenciais, são secundárias, porém é realidade
também que em assuntos, então, centrais, mesmo estes, os protestantes
discordam. A salvação do homem, os sacramentos e a justificação são somente
alguns exemplos.
Exemplificando: algumas seitas pregam que Jesus
está simbolicamente presente na Eucaristia. Outros, como os luteranos, creem o
contrário, que Jesus está realmente presente na Eucaristia. Algumas
denominações pregam que uma vez salvo, o crente não poderá jamais perder a sua
salvação, não importa se faça o bem ou o mal. Outros pregam que o pecado pode
causar a condenação do homem, mesmo após justificado. Algumas seitas afirmam
que o ser justificado é apenas declarado justo, enquanto outras afirmam
que o ser justificado é tornado justo.
Jesus jamais quis que seus discípulos estivessem
divididos, desunidos, mergulhados num caos doutrinário como está o
protestantismo desde a sua origem [36]. Jesus, pelo contrário, pediu a união de
seus seguidores: para que todos sejam um,
assim como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, que também eles estejam em nós (Jo 17,21). E São Paulo exorta aos cristãos a
unidade doutrinária com estas palavras: um só corpo e um só Espírito...um só Senhor, uma só fé, um só batismo (Ef 4,4-5). Como, então, as milhares de seitas
protestantes podem ser denominadas de "Igrejas verdadeiras" quando as
suas simples existências já refutam tal presunção? Como doutrinas tão
heterodoxas e contraditórias podem servir de instrumento divino de união,
desejada por Jesus? Sobre isto, o leitor deve lembrar das palavras de Jesus: pela árvore se conhece os frutos (Mt 12,33). Por este versículo, vemos que a
árvore da história do protestantismo e da Sola Scriptura está recheada de maus frutos.
[Topo]
NÃO PERMITE A INTERPRETAÇÃO DEFINITIVA DA
BÍBLIA
A doutrina da Sola
Scriptura não permite a interpretação definitiva de nenhuma passagem bíblica
Como temos visto, a Sola Scriptura supõe que basta uma Bíblia como regra de fé para se obter a verdadeira
interpretação de qualquer passagem bíblica simplesmente comparando este verso
com o restante da Bíblia. Na prática, contudo, o remendo saiu pior que a
fratura, pois acaba por impedir que o crente possa chegar a uma certa e definitiva interpretação de qualquer passagem bíblica.
O protestante, na verdade, interpreta a Bíblia
mais a partir de uma opinião subjetiva que de uma verdade objetiva. Por
exemplo, digamos que o protestante A estudou a determinada
passagem bíblica e chegou à conclusão X. O protestante B estudou a mesma passagem, mas concluiu Y. Então, o protestante C estudou a mesma passagem dos
outros dois, mas chegou a uma interpretação Z [37]. As interpretações X, Y e Z são contraditórias,
entretanto cada um acha que chegou à verdadeira interpretação bíblica porque cada um estudou e comparou a Bíblia
pela Bíblia.
Existem, agora, somente duas saídas para estes
três protestantes: 1) todos estão errados; 2) somente um está correto. Três
interpretações contraditórias jamais podem estar simultaneamente corretas [38].
O problema aqui é que, sem haver uma autoridade infalível que diga qual das
três interpretações é a verdadeira (objetivamente verdadeira), não há meios
para se saber qual das três é a correta seguramente. Cada protestante está,
portanto, em meio a uma interpretação pessoal baseada meramente em opinião
pessoal. Estudos e mais estudos são vãos. Cada protestante torna-se, com isso,
sua própria autoridade final, ou seja, seu próprio Papa.
Na prática o próprio protestantismo nos mostra
que este raciocínio é verdadeiro. Pelo fato de somente a Bíblia não ser
suficiente como regra de fé (se fosse, todos os protestantes concordariam em
interpretação), cada denominação têm que se render e aderir fixamente às suas
próprias interpretações bíblicas. Logo, se existem várias possíveis
interpretações da Bíblia, nenhuma é de fato definitiva. E se não há interpretação definitiva da Bíblia o protestante não têm como saber se sua
interpretação é verdadeira ou falsa.
Uma boa comparação seria com a lei moral. Se
cada um pudesse determinar por sua própria opinião o que é certo e errado, não
restaria nada mais que um relativismo moral, e cada uma fixaria seus próprio
padrões morais. Entretanto, Deus definiu leis morais absolutas para nós (em
adição às que conhecemos pelas leis naturais), e por isso podemos analisar cada
ato e reconhecer se é moralmente bom ou mal. O mundo seria impraticável sem
moral absoluta.
Cada denominação protestante afirma, lógico, que
possui a verdadeira interpretação bíblica. Todas fazem isso. Se não fizessem,
perderiam membros. Entretanto, se afirmam que possuem a verdadeira
interpretação bíblica, em detrimento às demais, então está se autoproclamando
autoridade final. O problema aqui, se os leitores ainda não notaram, é que este
detalhe viola o princípio da Sola Scriptura, que rejeita
qualquer autoridade final que não seja a própria Bíblia. Cheque-mate.
Por outro lado, se uma denominação reconhece que
sua interpretação bíblica não é mais correta que a de outra, então voltamos ao
eterno dilema: qual interpretação está
correta? existe alguma, então, que está correta? e se todas são falsas?. Nosso
Senhor disse: Eu sou o caminho, a verdade e a vida (Jo 14,6). O problema aqui é que cada
denominação, na prática, afirma possuir a única interpretação correta.
Conclusão, milhares de interpretações corretas diferentes, que resultam em uma
total impossibilidade de se conhecer a real e definitiva interpretação a uma
passagem bíblica qualquer. Em outras palavras, nenhum seita protestante pode
dizer a autoridade está aqui em relação a uma interpretação bíblica.
[Topo]
FALTAM SETE LIVROS NA BÍBLIA PROTESTANTE
Para sua decepção, os protestantes são culpados
de violar sua própria doutrina. A Sola Scriptura proíbe que algo seja acrescentado ou subtraído das Escrituras, porém os
protestantes retiraram sete livros das Escrituras do Antigo Testamento, assim
como porões de outros dois. Estes são erroneamente chamados de Apócrifos (não autênticos) pelos protestantes, e de deuterocanônicos (segundo cânon) pelos católicos: Tobias, Judite, 1 e 2 Macabeus, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc, partes de Daniel e Ester.
Defendendo seu cânon incompleto, os protestantes
apresentam alguns argumentos, tais como: 1) O cânon menor, chamado cânon farisaico ou palestinense do Antigo Testamento, foi aceito por Jesus e seus
apóstolos, pois eles nunca citaram nenhuma fonte dos livros deuterocanônicos;
2) O Antigo Testamento foi fechado no tempo de Jesus, e este era composto pelo
cânon menor; 3) Os próprios judeus aceitaram o cânon menor no sínodo de Jâmnia
(ou Javneh) em 90 d.C.; 4) Os livros deuterocanônicos contém doutrinas
antibíblicas.
Vejamos cada um destes argumentos:
1) Sobre este, que Jesus e seus apóstolos
aceitaram o cânon menor, um exame das citações neotestamentárias do Antigo
Testamento demonstrará a falácia. O Novo Testamento cita o Antigo cerca de 350
vezes, e em aproximadamente 300 destas (86%!) foram retiradas da septuaginta, a tradução grega do Antigo Testamento,
largamente usada no tempo de Cristo. Esta versão, a septuaginta, continha os
deuterocanônicos. Não há razão para dizer que Jesus e os seus discípulos
aceitaram o cânon menor, quando na maioria das vezes utilizaram fontes do
Antigo Testamento que continham os
deuterocanônicos.
Tomemos o exemplo de Paulo, cujas cartas
missionárias eram dirigidas a regiões fora da palestina. Deve-se notar, por
exemplo, que seu sermão em Antioquia na Pisídia presumiu um conhecimento, entre seus ouvintes,
da Septuaginta e uma vez que a comunidade
fora formada, o conteúdo de suas cartas a estas era baseado na Septuaginta [40] Obviamente, Paulo assim não rejeitava, mas se utilizava do cânon
maior, com os livros deuterocanônicos.
Além do mais, é errado dizer que estes livros não
foram citados no Novo Testamento [41] e que tal citação deve ser pré-requisito
para a canonicidade de um livro bíblico. Algumas fontes dizem que os
deuterocanônicos são citados no Novo Testamento, no mínimo, 150 vezes [42].
Acrescido a isto, livros do cânon menor, como Eclesiastes, Abdias e Ester não são citados por Jesus ou seus apóstolos, e nem por isso os
protestantes retiraram-nos do seu cânon. Obviamente este argumento não serve
para determinar a canonicidade de um livro.
2) A evidência histórica mostrará que o
argumento protestante de que o cânon do Antigo Testamento foi fechado no tempo
de Jesus é falso. Primeiro que não havia nenhum cânon palestino oficial, pois
existia neste tempo três cânones em circulação [43], além da Septuaginta.
Segundo, as evidências mostram que o judaísmo durante os últimos dois séculos antes de Cristo e o primeiro
século depois de Cristo não era uniforme em seu entendimento sobre quais livros
deveriam ser considerados sagrados. Existiam muitas opiniões dentro e fora de Israel
sobre esta questão [44].
3) Usar o sínodo de Jâmnia para justificar o
cânon menor é problemático por algumas razões: a) tal decisão, tomada cerca de
50 anos após a morte de Cristo, não tem relação alguma com o cânon dos livros
cristãos, pois os rituais vetero-testamentários (como não comer carne de porco)
não têm relação com o cristianismo; b) é questionável se de fato este sínodo
possuiu uma visão definitiva e autoritária sobre o cânon do Antigo Testamento
das Escrituras, pois a lista continuou a variar dentro judaísmo até o século 4 d.C. [45]; c) o sínodo foi, de certo modo, formado
devido a polêmica contra a seita dos cristãos, portanto em total oposição ao
cristianismo. Estes judeus aceitaram o cânon menor porque os cristãos aceitavam
o cânon maior da Septuaginta; d) as decisões deste sínodo representaram a
decisão de apenas um ramo do judaísmo farisaico, o da palestina, e não do
judaísmo como um todo.
4) Por fim, para os protestantes afirmarem que
os deuterocanônicos possuem doutrinas antibíblicas é decididamente um caso de
insegurança dogmática. Esta conclusão foi tomada porque os reformadores,
claramente em antagonismo com a Igreja Católica, tomavam a Bíblia a priori como um livro de doutrinas protestantes. Descartaram os deuterocanônicos
porque continham doutrinas católicas, como 2 Mac 12,42-46, que claramente baseia a oração pelas almas do
purgatório: santo foi e piedoso o seu
pensamento, e foi essa a razão por que mandou que se celebrasse pelos mortos um
sacrifício expiatório, para que fossem absolvidos de seus pecados. Lutero, claramente, quis
retirar também do Novo Testamento livros como Apocalipse, Hebreus e Tiago, este merecendo o nome de epístola de palha, onde nada de evangélico é encontrado [46], isso devido, sem dúvida, o fato de que Tiago afirmava que somos
salvos pela fé e pelas boas obras (Tg 2,14-26), refutando a doutrina recém-criada
por Lutero de que somos salvos somente pela fé, sem participação das obras. Lutero foi convencido por
seus correligionários a não retirar mais este livro da Bíblia.
Além deste fato acima, existe o testemunho
histórico da continuidade do cânon bíblico; enquanto vimos que existiam
disputas em relação ao cânon bíblico, duas considerações são evidentemente
verdadeiras: a) com certeza os deuterocanônicos eram usados pelos cristãos do
primeiro século, a começar por Jesus e seus apóstolos; b) desde que foi
definido o cânon no século 4, não vemos mudança alguma em relação ao conteúdo
da Bíblia. Na prática, a única disputa que surgiu após este evento veio com a
reforma protestante, somente no século 16, ao decidirem que poderiam
simplesmente lançar no lixo a continuidade de 11 séculos do cânon bíblico em
sua existência formal, e 15 séculos de existência prática.
O fato de que qualquer pessoa possa vir e
simplesmente alterar a continuidade de um tema tão central como o conteúdo dos
livros da Escritura deveria levar o cristão a pensar seriamente sobre um
detalhe. Este cristão deveria se perguntar: com que autoridade esta pessoa pôde fazer esta alteração? Tanto a história como os próprios escritos de
Lutero mostram que suas ações foram baseadas em nada mais que sua opinião
pessoal. Certamente, tal "autoridade final" falha grosseiramente no
que se requer para que alguma alteração canônica seja feita, especialmente
quando se considera que o processo de identificar o cânon bíblico envolveu um
processo guiado pelo Espírito Santo, levou séculos, e envolveu algumas das
maiores mentes do cristianismo assim como alguns Concílios da Igreja. Mais
interessante é o fato de que outros chamados reformadores - e desde então todos
os protestantes - aceitaram a alteração do cânon de Lutero, mesmo que todos
dissessem que eram fiéis à Bíblia e insistiam que nada deveria ser acrescentado
ou retirado de suas páginas!
[Topo]
SE ORIGINOU DOS PROBLEMAS EMOCIONAIS DE
LUTERO
Se algo deve ser dito com relação a Martinho
Lutero é o fato de que ele era cronicamente assolado por uma combinação de
dúvidas e inseguranças quanto a sua própria salvação e uma sensação de extrema
impotência em face às tentações do pecado. Ele próprio escreveu: meu espírito está completamente partido e estou
em eterno estado de melancolia; pois, faça o que fizer, minha retidão e minhas
boas obras não me trazem ajuda ou consolação alguma [47].
À luz desta realidade, pode-se acessar o perfil
emocional e psicológico do pensamento de Lutero e seu impacto na origem de sua Sola Scriptura. Uma pequena análise pode mostrar que esta
doutrina nasceu da necessidade que Lutero tinha de se ver livre de seus
sentimentos de culpa, insegurança e tentação que o "torturavam".
Considerando que o próprio Lutero admite uma
tendência obsessiva ao pecado, assim como uma inabilidade de resistir a ele,
fica claro que ele sofreu de "escrupulosidade", e todos os estudiosos
luteranos admitem isso [48]. Escrupulosidade significa que uma pessoa fica
extremamente ansiosa quanto a ter cometido um pecado quando na verdade não há
razão para tal, e uma pessoa escrupulosa é aquela que geralmente supervaloriza
seu pecado, com uma correspondente confiança em Deus. Também é relevante notar
que a escrupulosidade parece ser baseada em alguma disfunção psicológica [49].
Em outras palavras, Lutero provavelmente nunca
desfrutou de paz espiritual e psicológica, pois a voz de sua
"consciência" sempre o alcançava sobre qualquer assunto, real ou imaginário.
É natural que alguém tão atordoado busque refúgio nesta voz, e para Lutero este
refúgio foi encontrado na doutrina da Sola Fide, ou a salvação somente pela fé.
Mas desde que resistir ao pecado e praticar boas
obras são componentes essenciais para nossa salvação, e desde que estes fatos
são satisfatoriamente componentes e defendidos pela Igreja Católica, Lutero se
encontrou diametralmente oposto à doutrina da Igreja. Pelo fato de a Igreja
ensinar a necessidade de algo que ele exatamente não podia fazer, tomou uma
decisão drástica - uma que "resolveria" sua escrupulosidade: rejeitou
a autoridade da Igreja, contida no seu Magistério cujo Papa é o chefe, e
afirmou que era algo contrário à Bíblia. Em outras palavras, por dizer que a Sola Scriptura deveria ser a verdadeira doutrina cristã, Lutero repugnou a autoridade
que o fazia reconhecer que sua própria espiritualidade era disfuncional.
[Topo]
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por todas estas razões, então, é evidente que a
doutrina protestante da Sola Scriptura é uma extremamente antibíblica, humana e errônea crença que deve ser
desacreditada e rejeitada completamente. Todos os que são genuinamente cristãos
e seguem as verdades que Jesus ensinou - mesmo que contradiga o seu sistema religioso
atual - devem reconhecer a falha desta doutrina, falha esta óbvia pelas
Escrituras, pela história e pela lógica.
A plenitude da verdade cristã, sem erro, é
encontrada somente na Igreja Católica, a mesma Igreja que o próprio Cristo
estabeleceu sobre a terra. De acordo com esta Igreja, a Sola Scriptura é uma distorção da autoridade cristã. Na realidade, a verdadeira e
direta regra de fé do cristão é a Igreja, que por sua vez absorve o que ensina
da Revelação Divina - a Tradição
Escrita e a Tradição Oral, que juntas formam a regra indireta de fé.
A Escritura e a Tradição são as fontes
inspiradas da doutrina cristã, enquanto que a Igreja - entidade histórica e
visível em sucessão ininterrupta desde Pedro e os demais apóstolos - é a intérprete infalível da doutrina cristã. Somente aceitando
completamente esta regra de fé que os seguidores de Cristo podem aderir a todas
as coisas que Ele ordenou aos seus apóstolos ensinar (Mt 28,20). Somente
aceitando completamente esta regra de fé o cristão pode conhecer a
verdadeira doutrina pregada por Cristo, e nada além da verdade.
[Topo]
REFERÊNCIAS
Nota: entre as referências estão citados
alguns autores protestantes. Seus trabalhos não são obras recomendadas, porém
mostram que os pontos apresentados neste trabalho são verdadeiros e válidos
mesmo entre os protestantes.
1.
A reforma
protestante não foi uma reforma no sentido verdadeiro da palavra, mas sim uma
revolução - uma alteração violenta da legítima religiosidade e ordem civil.
2.
W.E.
Vine [protestante], Vine's Expository Dictionary of New Testament Words
(McLean, VA: McDonald Publishing House, n.d.), p. 387. Cf. St. Afonso de Liguóri, Exposição e defesa
de todos os assuntos de fé discutidos e definidos pelo Santo Concílio de
Trento; com a refutação dos erros dos pretensos reformadores, etc. (Dublin:
James Duffy, 1846), p. 50.
3.
Apesar de
todos os livros do Novo Testamento já terem sido escritos enquanto João
finalizava o Apocalipse, ainda não estavam organizados como Sagrada Escritura.
4.
A palavra
traduzida como ordenança é também traduzida como ensinamento ou tradição, por
exemplo, a NIV traz ensinamento com uma nota dizendo: "ou tradição".
5.
Vine, op.
cit., p. 564
6.
Um exemplo
desta forma interpretativa envolve Ap 12. Os Padres da Igreja entenderam a
mulher vestida de sol como referência à Assunção da Virgem Maria. Alguém
afirmar que esta doutrina não existia até 1950 (o ano em que o Papa Pio XII
definiu-o como dogma de fé) corresponde a uma grande ignorância de história
eclesial. Essencialmente, a crença surgiu desde o início, mas não fora
formalmente definida até o século 20. Deve-se saber que a Igreja geralmente não
costuma definir uma doutrina formalmente a não ser que esta seja questionada
por correntes heréticas perigosas. Tais ocasiões requerem uma necessidade
oficial de definir parâmetros sobre a doutrina em questão.
7.
A Igreja
Católica afirma que "o corpo dos bispos", os sucessores dos
apóstolos, também goza de infalibilidade, quando, em união com o Papa,
"exerce seu magistério supremo, sobretudo em um Concílio Ecumênico"
(cf. CCE #891). "Ligar e desligar" é uma terminologia rabínica, e se
refere à autoridade de seus ensinamentos e interpretações. Cristo claramente
pretendeu, portanto, que seus apóstolos, sob a liderança de Simão Pedro (contudo
somente Pedro recebeu o poder das chaves), possuíssem a autoridade para ensinar
a correta interpretação.
8.
A
afirmação protestante de que a Bíblia interpreta a si mesma nada mais é do que
uma futilidade. Afirmam que cada pessoa pode chegar a uma correta interpretação
bíblica comparando seus versículos com outros da Bíblia. O problema com este
argumento pode ser assim demonstrado: peça a dez pessoas para darem sua
interpretação sobre um certo versículo bíblico, e é provável que encontre dez
interpretações diferentes. Se a Bíblia pudesse interpretar a si mesma, sempre
se chegaria à mesma conclusão, independente da época em que se estuda, mesmo
pelas mais diferentes pessoas. E se tal diferença de interpretações pode ser
verdadeira para apenas dez pessoas, imagine então o resultado quando se
multiplica este número por milhares ou milhões? A história já demonstrou tal
resultado, e seu nome é Protestantismo.
9.
Existem
alguns estudiosos que afirmam que 2 Pd foi o último livro escrito do Novo
Testamento, datando do início do século dois. Pelo fato de não haver consenso
entre os especialistas sobre a data acurada, é suficiente para nosso propósito
aceitar a visão geral de que ao fim do século um todos os livros do Novo
Testamento já haviam sido escritos.
10.
Veja, por
exemplo, Santo Irineu, Contra as Heresias 3,3; Tertuliano, Prescrição contra os
hereges 32, Orígenes, Primeiros princípios, 1, prefácio.
11.
Veja, por
exemplo, Santo Inácio, Carta aos Esmirnenses 8-9; Carta aos Filadélfos,
introdução e cap.1-4; Carta aos Magnésios, 7.
12.
Veja, por
exemplo, 1 Clemente 1,56,58,59; Santo Inácio, Carta aos Romanos, introdução e
cap.3; Santo Irineu, Contra as Heresias 3,3; Tertuliano, Prescrição contra os
hereges 22; Eusébio, História Eclesiástica 5,24,9.
13.
Msr.
Patrick F. O'Hare, LL.D, The Facts about Luther (Cincinnati: Pustet, 1916;
Rockford, IL; TAN, 1987), pp. 215-255.
14.
Walch,
XIII, 2195, citado em The Facts about Luther, p. 15.
15.
É
relevante que os decretos de um Concílio Ecumênico não porta autoridade a menos
que seja ratificados pelo Papa.
16.
Dois
versículos favoritos dos arianos para respaldar sua crença são Pv 8,22 e Jo
14,28.
17.
John Henry
Newman, Os arianos do quarto século.
18.
Henry
G. Graham, Where we got the Bible: our debt to the Catholic Church (St Louis:
B. Herder, 1911; Rockford, IL: TAN, 1977, 17th edição), pp. 34-35.
19.
É a mesma
lista dada pela declaração final, explícita e infalível da Igreja sobre quais
os livros a serem incluídos na Bíblia, feita pelo Concílio de Trento, na sessão
IV, em 1546. Listas iniciais dos livros canônicos eram as listas do
"Decreto Gelasiano", dado pela autoridade do Papa Dâmaso em 382, e o
cânon do Papa Inocêncio I, enviada a um bispo franco em 405. Nenhum dos dois
documentos pretendia compor uma afirmação infalível a toda a Igreja, mas ambos
incluíam os mesmos 73 livros da lista de Trento 11 séculos antes. (The Catholic Encyclopedia [New
York: The Encyclopedia Press, 1913], vol. 3, p. 272).
20.
O leitor
deve notar que a Igreja Católica não afirma que a identificação dos livros da
Bíblia não os tornaram canônicos. Deus é quem é o autor da canonicidade. A
Igreja Católica afirma, isto sim, que somente ela detém a autoridade e
responsabilidade por identificar infalivelmente quais são os livros canonizados
por Deus que devem compor a Bíblia cristã.
21.
Commentary
on John, cap. 16, como citado em Paul Stenhouse, Catholic Ansewrs to
"Bible" Christians (Kensington: Chevalier Press, 1993), p. 31.
22.
Graham,
op. cit, p. 31.
23.
Nem as
primeiras cópias da Bíblia, o Codex Vaticanus e o Codex Sinaiticus, ambos
datados do quarto século d.C., nem qualquer outra cópia contém a Bíblia
inteira, pois partes dos manuscritos foram perdidos ou destruídos. A grande
maioria dos manuscritos que existem atualmente são apenas fragmentos da Bíblia.
24.
A ironia é
que foi pelos esforços incansáveis e laboriosos dos monges católicos em suas
clausuras que a Palavra de Deus escrita sobreviveu através dos séculos. A
acusação de que os católicos fizeram de tudo para suprimir a Bíblia é uma das
mais perniciosas falsidades, e é facilmente refutada pelo atento exame nas
pesquisas da história da Igreja. Muito pelo contrário, a Igreja Católica, cuja
única função é ser a guardiã do Depósito da Fé, protegeu a Bíblia das traduções
falsas e espúrias, e foram estas versões que foram destruídas ou queimadas para
evitar que falsos evangelhos circulasse.
25.
Raymond
F. Collins, Introduction to the New Testament (Garden City, NY: Doubleday &
Company, Inc., 1983), p. 77.
26.
Ibid., pp.
100-102.
27.
Bruce
M. Matzger [protestante], The Text of the New Testament: its transmission,
corruption and restoration (Oxford University Press, 1992), pp. 221-225,
234-242.
28.
Os
protestantes argumentam que mesmo com as variações nos manuscritos bíblicos,
nenhum aborda as doutrinas principais. Mesmo que fosse verdadeira esta
afirmação, não altera o fato de que os protestantes estão verdadeiramente
admitindo, ao menos indiretamente, que aceitam algumas doutrinas que são
diferentes da Bíblia "real". E se isto é verdadeiro, então o próprio
protestante começa a desmerecer a Sola
Scriptura.
29.
Metzger,
op. cit., pp. 226-228.
30.
Collins,
op. cit., p. 102.
31.
Metzger,
op. cit., p. 234.
32.
Entre os
vários exemplos que poderiam ser citados, por motivos de espaço, vamos
considerar somente algumas ilustrações sobre este assunto. Em Jo 1,1, a NWT
traz, "...e a Palavra era um deus" e não "e a Palavra era
Deus", isto porque os Testemunhas rejeitam a divindade de Cristo. Em Cl
1,15-20, a NWT acrescenta a palavra outro no texto quatro vezes porque crêem
que Jesus era uma criatura. Em Mt 26,26 a NWT traz, "...isto significa meu
corpo..." e não "...isto é o meu corpo", porque os Testemunhas
negam a Real Presença de Jesus na Eucaristia.
33.
Além do
mais, a versão latina Vulgata recebeu uma aprovação particular pelo Concílio de
Trento entre todas as demais versões latinas existentes na época. O Concílio
declarou: ...esse mesmo sacrossanto Concílio determina e declara: que nas
preleções públicas, nas discussões, pregações e exposições seja tida por
legítima a antiga edição da Vulgata, que pelo longo uso de tantos séculos se
comprovou na Igreja; e que ninguém, sob qualquer pretexto, se atreva ou presuma
rejeitá-la. (Sessão IV [8-4-1546], A edição da Vulgata da Bíblia e o modo de
interpretação, 785). Desde então, como afirmou o Papa Pio XII na Carta
Encíclica Divino Afflante Spiritu ("Sobre a promoção dos estudos
bíblicos"), a Vulgata, "quando interpretada no sentido que a Igreja
sempre entendeu" é " livre de erro em matéria de fé e moral". Em
1970 o Papa Pio IX (1903-1914) iniciou a revisão da Vulgata para uma maior
acurácia textual. Após sua morte, este enorme projeto está sendo continuado por
outros. Em 1979 João Paulo II promulgou a "Nova Vulgata" como Editio
typica ou "edição normativa".
34.
Notemos
que o inventor da imprensa - Johannes Gutenberg - era católico, e que o
primeiro livro impresso foi a Bíblia (circa 1455). Também deve ser notado que
esta primeira Bíblia continha os 73 livros que até hoje compõem a Bíblia
católica. Portanto, os protestantes retiraram os 7 livros da Bíblia quando esta
já existia em formato impresso.
35.
Alguns
estimam que existam cerca de 25 mil denominações protestantes diferentes.
Contando-se a partir de 500 anos de história protestante, desde Lutero (1517),
este número significa uma média de uma nova denominação protestante nova por
dia! Sabemos, contudo, que estes dados são desatualizados, e existem muito mais
de 25 mil denominações/seitas protestantes diferentes.
36.
Mesmo os
primeiros reformadores - Martinho Lutero, João Calvino e Ulrich Zwingli - não
concordavam em assuntos doutrinários e classificaram as doutrinas uns dos outros
como heréticas.
37.
Três aqui
é usado apenas como ilustração. A quantidade histórica (isto é, o número das
variações nas interpretações de várias passagens) é imensamente maior.
38.
Não é
negado que uma passagem da Escritura possa ter diferentes níveis de interpretação
ou que possa ter diferentes níveis de significado em termos de sua aplicação na
vida do cristão. O que é negado aqui, contudo, é o fato de uma passagem possuir
mais de um significado doutrinário ou teológico oposto a outro. Por exemplo, se
duas pessoas afirmam, respectivamente, "X" e "não-X" para
uma determinada interpretação, ambos não podem estar corretos. Tome a doutrina
da Real Presença na Eucaristia. Se o primeiro afirma que Jesus está presente no
pão e no vinho, mas a segunda pessoa afirma que Cristo não está presente no pão
e no vinho, é impossível que ambas as doutrinas estejam corretas ao mesmo
tempo.
39.
O cânon
farisaico, usado pelos judeus da Palestina, não continha os livros
deuterocanônicos. O cânon alexandrino ou Septuaginta, usado largamente pelos
judeus da diáspora (regiões helenísticas fora da Palestina), continha os livros
deuterocanônicos.
40.
W.H.C.
Frend [protestante], The Rise of the Christianity (Philadelphia, PA: Fortress
Press, 1984), pp. 99-100.
41.
Para
alguns exemplos, compare as seguintes passagens: Mt 6,14-15 e Eclo 28,2; Mt 6,7
e Eclo 7,15; Mt 7,12 e Tb 4,15-16; Lc 12,18-20 e Eclo 11,19; At 10,34 e Eclo
35,15; At 10,26 e Sb 7,1; Mt 8,11 e Br 4,37.
42.
Lee
Martin McDonald [protestante], The Formation of the Biblical Canon, Apêndice A
(Nashville, TN: The Parthenon Press, 1988) (Lista entitulada "New
Testament citations and allusions to apocryphal and pseudoeptgraphal
writtings", adaptado de The Text of the New Testament, de Kurt Aland e
Barbara Aland, dois famosos biblistas).
43.
Incluem a)
o cânon de Qumram, conhecido pelos Manuscritos do Mar Morto; b) o cânon
farisaico e c) o cânon saduceu/samaritano, que inclui somente o Torah (os
primeiros livros do Antigo Testamento).
44.
McDonald,
op. cit., p. 53.
45.
Ibid, p.
60.
46.
Hartmann
Grisar, SJ, Marthin Luther: His life and work (B. Herder, 1930: Westminster,
MD: The Newman Press, 1961), p. 426.
47.
Jansen,
Vol III, p. 84, como citado em O'Hare, op. cit., p. 51.
48.
Cf. Fr
William Most, "Somos salvos somente pela fé?" fita cassete da
Catholic Answers, PO Box 174900, San Diego, CA 92177.
49.
Fr.
Peter Stravinskas, ed., Catholic Encyclopedia (Huntington, Indiana: Our Sunday
Visitor, Inc. 1991), p. 873.)
Autor: Joel Peters
Tradução: Rondinelly
Ribeiro