Ezequiel, pertencente à linhagem sacerdotal, viveu, como
Jeremias, no período mais tormentoso da história hebraica.
Em 598/97 a.C, antes de ter completado 30
anos, foi deportado de Jerusalém para
a Caldeia, juntamente com a rei Joiakim (ou Jeconias) e mais dez mil pessoas
entre nobres, guerreiros e artesãos. Permaneceu no exílio até à morte, ocorrida
entre os anos 571 a 561 a.C.
Jerusalém não fora ainda destruída, porque o rei Joiakim,
tendo sucedido a seu pai Joiaquim (talvez assassinado quando o exército de
Nabucodonosor se aproximava da cidade santa), rendera-se ao cabo de três meses
de assédio.
Todavia, a deportação da corte e do escol da população enfraqueceu-a
sobremaneira, constituindo uma lição tremenda, mas infelizmente inútil. Entre a
população deixada no país, sob o governo de Sedecias, nutriam-se veleidades de
independência, que explodiram , em aberta rebelião no ano 588,
causando finalmente a tomada e a
destruição de Jerusalém e do seu templo (Jer 37-39 e 52).
Todas as visões do profeta exilado, como as de Jeremias, que
permaneceu na pátria, vendo e vivendo o trágico destino da cidade santa, vinculam-se
intimamente a esses acontecimentos. Ambos os profetas vêem e anunciam
continuamente, em todas as formas, o futuro imediato, imersos na angústia de
ver um povo que não lhes presta ouvidos e se atira ao báratro.
A própria morte da esposa de Ezequiel, lembrada pelo
profeta, tornou-se um símbolo da ruína de Jerusalém e do templo, ocorrida na
mesma época. Não faltam, porém, alguns clarões que permitem visões longínquas,
as quais se multiplicam e até se tornam constantes, quando aos primeiros
deportados se juntou a avalanche dos novos, trazendo gravados no espírito os
horrores do cerco, do morticínio e da deportação.
Ao contrário de Jeremias, que tem páginas patéticas,
transbordantes de extrema sensibilidade, Ezequiel é, muitas vezes, áspero,
duro, quase desapiedado. Mas as suas predições e ações simbólicas, bem como as
suas mortificações voluntárias, para inclinar, se possível fora, Israel a uma
conduta de fidelidade para com Deus e a uma sabedoria política, são inspiradas
por um coração magnânimo e forte ao mesmo tempo, baseado na fé, na dedicação ao
seu povo e no amor à pátria.
Em seu estilo abundam as ações simbólicas, originais e
mudas, apresentadas como narrações. As partes poéticas são raras e encontram-se
quase exclusivamente nas profecias contra as nações. Ezequiel é minucioso nas
descrições, preciso e até cansativo às vezes. O projeto da divisão da Terra
Prometida, o desenho do novo templo e a indicação das leis ao mesmo atinentes,
parecem mais obra de técnico do que de profeta.
Profecias nitidamente messiânicas são os trechos: 17,22-24;34,11-16;47;48.
Mas toda a terceira parte, do c. 33
em diante, é concebida em termos de
expectação messiânica.
Ezequiel é o primeiro representante dum novo gênero literário
de mensagem profética, muito desenvolvido, em seguida, na literatura judaica do
séc. II a.C. Trata-se do gênero apocalíptico. No Novo Testamento, ele figura no livro do Apocalipse (termo
grego que significa "revelação"). O próprio S. João deu ao seu livro
o nome de f<profecia" (Apoc 1,3), termo não muito apropriado ao caráter da obra.
Eis as características principais do gênero apocalíptico:
1.
A mensagem profética limita-se
à predição do futuro, especialmente à era messiânica e ao fim do mundo.
2. Esse futuro, ora radiante, ora pavoroso, aparece ao vidente
sob a forma de cenas simbólicas em que atuam seres humanos e sobre-humanos, animais
e astros, quais outras tantas figuras dos acontecimentos vindouros.
3.
A intervenção freqüente de
anjos, como guias e intérpretes dos cenários contemplados pelo profeta.
4.
Os eventos relacionados
com o fim dos tempos, quer messiânicos, quer cósmicos, revestem-se dum colorido
empolgante de convulsões cósmicas e telúricas, e isso, de tal maneira, que este
motivo, embora acessório, é considerado comumente como propriedade prevalente
do estilo apocalíptico.