Verdadeiramente
a Ausência de Deus Não Existe
"Filme Agnus Dei - As
inocentes", de Anne Fontaine
A cineasta francesa
realiza a sua melhor película neste drama sobre mulheres entre o horror e a
vida. Uma comunidade de monjas de clausura polacas que foram agredidas e
violadas por soldados do exército soviético no fim da II Guerra Mundial. Uma
enfermeira agnóstica de uma missão médica do exército que se prontifica a
ajudá-las, partilhando o seu sofrimento. A desorientação da superiora que,
querendo contornar o mal, o multiplica. A vida que ajuda a fé a seguir em
frente desde a maternidade como força transcendente. O encontro de cristãos,
judeus e agnósticos entre a dor e a compaixão. As monjas ajudadas pela
generosidade corajosa da jovem médica a quem reconhecem como um dom, e ela
mesma abençoada por este encontro e pela sua relação com aquela comunidade de
orantes feridas. Os pequenos recém-nascidos como uma irrupção da luz que
permite olhar para diante mais do que recordar um passado traumático. Uma
canção à vida que não só é biologia, mas que também sabe a eternidade. O bom
Deus se revela de tal forma que a mente humana se rende a transcendência. A
providência numa ação que encanta profundamente o ser. Age para impactar a
completude humana!
Papa Francisco Louva
Nostalgia de Deus
É a «nostalgia de Deus» que «rompe com inertes
conformismos» e impele para a «procura de Deus, como os magos, nos lugares mais
recônditos da história», afirmou o papa Francisco, na basílica de São Pedro,
no Vaticano (06/01/2017).
Os magos
que vão ao encontro de Jesus recém-nascido constituem “o retrato da pessoa
crente, da pessoa que tem nostalgia de Deus; o retrato de quem sente a falta da
sua casa: a pátria celeste. Refletem a imagem de todos os seres humanos que não
deixaram, na sua vida, anestesiar o próprio coração”.
No lado oposto da
inquietação e da busca estão aqueles que, como o rei Herodes, sentados na
cadeira de um poder terreno omnipotente, têm medo de perder os privilégios: «É
aquela perturbação que leva a pessoa, à vista da novidade que revoluciona a
história, a fechar-se em si mesma, nos seus resultados, nos seus conhecimentos,
nos seus sucessos».
É a perturbação de quem
repousa na sua riqueza, incapaz de ver mais além. É a perturbação que nasce no
coração de quem quer controlar tudo e todos; uma perturbação própria de quem
vive imerso na cultura que impõe vencer a todo o custo, na cultura onde só há
espaço para os “vencedores” e a qualquer preço, prosseguiu o papa.
«Descobrir
que o olhar de Deus levanta, perdoa, cura. Descobrir que Deus quis nascer onde
não o esperávamos, onde talvez não o quiséssemos; ou onde muitas vezes o
negamos. Descobrir que, no olhar de Deus, há lugar para os feridos, os
cansados, os maltratados e os abandonados: que a sua força e o seu poder se
chamam misericórdia. Como é distante, para alguns, Jerusalém de Belém!»,
assinalou.
Tenho Nostalgia de Deus
O intelectual português Dr. José Tolentino Calaça Mendonça recorda
um filme de Manoel de Oliveira, o mestre do cinema da palavra. O filme
intitula-se “O convento”, e é um grande fresco das questões centrais da arte de
Oliveira: o destino do ser humano, a culpa e a redenção, o amor (será possível
o amor? – pergunta-se o realizador), o sofrimento e a graça.
No filme há
um diálogo, a dada altura, sobre a inquietação vivida por uma das personagens:
«O que é que tem?». Ela, num primeiro momento, fica calada; depois responde:
«Tenho nostalgia de Deus».
Verdadeiramente
a ausência de Deus não existe. Mesmo quando o ambiente cultural parece dominado
pela distância ou pela indiferença em relação à questão de Deus, é importante
dizer que as coisas não são exatamente assim. Deus permanece uma questão, tanto
para quem crê como para os não crentes. Há sempre, em cada coração humano, uma
espécie de nostalgia, uma abertura, uma disponibilidade para a vida do
espírito.
Devemos
aprender, talvez, a ler melhor a cultura contemporânea nas suas turbulências e
obsessões. Devemos escutar, talvez, sob a crosta dos rumores ensurdecedores, os
passos de Deus que sem cessar anda à nossa procura. A impressão digital de Deus
está tatuada no coração do ser humano.
É de
radical ortodoxia que não existe a ausência do Eterno e Todo-Poderoso. Assim
como não existe a ausência do belo, do amor, da felicidade e da busca
interminável do desconhecido... A ânsia de desejo, do querer, do saber e do
fazer e nunca estacionar no tempo e no espaço, ir além da escatologia na certeza
da eterna celestialidade. Silêncio, presença sublime do bom Deus e na solidão
do nosso coração sua habitação. No deserto da nossa vida, no pensar que tudo
está distante e na escuridão da dor, Deus é a luz da nossa gloriosa companhia!
Frei Inácio José do Vale
Professor e conferencista
Sociólogo em Ciência da Religião
Irmãozinho da Fraternidade da Visitação de Charles
de Foucauld
E-mail: [email protected]
Fontes:
https://www.google.com.br/#q=Jos%C3%A9+Tolentino+Mendon%C3%A7a+
http://snpcultura.org/sob_a_crosta_dos_rumores.html