Pati, te perdoo.
Sergio Sebold
Economista e Professor Independente
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Patricia, fiquei emocionado quando vi tua
entrevista na mídia, visivelmente transtornada e arrependida pelo episódio
ocorrido no Estádio do Grêmio em Porto Alegre. Acreditei na tua inocência
juvenil. Já passei por essa idade e também cometi meus pecados, preço da
inexperiência da vida. Mas, quando se faz, se age sem maldade, no ardor da
vida, sempre há espaço para o perdão. Infelizmente tu foste a vítima, o bode
expiatório, porque pelo que se sabe, milhares - intencionalmente com maldade - inclusive
os afrodescendentes presentes, fizeram a mesma coisa que tu fizeste. Coisas de
futebol.
Depois de uma
semana de trabalho, de pressão social, profissional de todos os lados, o
extravaso apaixonado numa partida até é saudável e age como catarse sob o
ponto de vista psíquico. Mas deste azar, uma câmera estava sobre ti naquele
exato momento; não buscando um ângulo de maldade, mas o ângulo de tua beleza
juvenil, teu entusiasmo, tua vibração com o time do coração. Sou de fé que
apenas seguiste a onda, no fenômeno da manada (alguém começou antes), mas o
fizeste sem maldade no coração. Em segundos de exposição, te tornaste a vilã
racista mais odiada do Brasil. Agora todos querem jogar pedra.
Infelizmente o relativismo barato do
racismo que campeia o Brasil, exaltado por pessoas inescrupulosas que ao invés
de reduzir este ranço histórico fazem exatamente o contrário, acirra ainda mais
esta cultura da diferenciação da pigmentação de sua pele (cota nas
universidades). Somos uma única raça humana; não há diferença alguma de
inteligência ou qualquer outro talento. A diferença está na má distribuição das
riquezas. Aqui está o mal.
Não conheço tua condição civil, mas se
surgisse na tua vida um jovem tão belo como o Aranha (goleiro) ou o próprio por
uma chance, talvez tu te derreterias por ele, sem qualquer sentido racista. Infelizmente
a intolerância e a falta de esportividade do Aranha levaram a esta celeuma toda,
embora ele já a tenha perdoado, segundo li numa entrevista. Aliás, me
pergunto, por que ele não mostra sua indignação pelo “bullying moral” de chamá-lo
pelo nome de um inseto repugnante? É Aranha, engolistes um frango. Quem tem
personalidade forte, passa por cima disso, não se humilha. Imaginemos o que
ocorreria se os juízes de futebol suspendessem cada partida, quando alguém
xingasse sua mãe; ou, não teríamos mais futebol, ou os torcedores passariam a se
comportar como cordeirinhos.
“Se ele fizesse a mesma coisa que o Daniel
(Alves) fez, quando jogaram uma banana lá na Europa para ele e comeu, você viu
que ninguém falou mais nada", disse Pelé, sobre o gesto do lateral
brasileiro ocorrido no Campeonato Espanhol, em abril, que gerou repercussão
mundial. Ganhou na raça, todo mundo se calou.
Pati, a história está cheia de heróis, que
mudaram o curso da civilização. Teu ato, ainda que inocente na minha visão, fará
uma imensa mudança na cultura da violência que infesta nossos estádios. Provocaste
a ira do legislador sobre você, mas mudaste a história. Serás crucificada com
uma sanção educativa, como também o time de tua paixão pela força da justiça;
mas, paradoxalmente fizeste um grande bem para toda sociedade, reduziste a
distância racista em nosso país. As pessoas pensarão um pouco mais nas suas
manifestações, ficarão mais civilizadas.
Ao longo da história houve pessoas que
pagaram com a própria vida para mudar o eixo da civilização, na eliminação das
injustiças de seu tempo. Cito alguns, Martin Luther King, John F. Kennedy, na
luta contra o racismo americano; Mahatma Gandhi, contra a exploração da Índia
pelos Ingleses; Tiradentes, contra a exploração portuguesa em nosso país; e o
maior de todos, Jesus Cristo, por nos abrir as portas da eternidade.
Por provocares a ira dos racistas,
curiosamente fizeste um grande bem. Eu te perdoo.