PERGUNTE e RESPONDEREMOS 049
– Jan 1962
A REENCARNAÇÃO DE BRIDEY MURPHY
CIÊNCIA
E RELIGIÃO
RAIMUNDO
(Teresina) e F. CH. (Promissão, SP): “O
famoso caso de Bridey Murphy constitui um dos indícios mais verossímeis de que
há reencarnação: em transe a paciente terá narrado os fatos ocorridos em sua
vida anterior, fatos devidamente comprovados por uma comissão de peritos”.
Que dizer a propósito ?»
O caso de Bridey Murphy
tornou-se famoso no mundo inteiro, sendo que no Brasil um livro do mesmo nome
se encarregou de o divulgar. Foi, durante algum tempo, tido como uma das provas
mais retumbantes do «fato» da reencarnação. Acontece, porém, que os cientistas,
estudando o episódio após a sua divulgação, se viram obrigados a dar ao relato
um sentido bem diverso do que se lhe atribuía... Ora esse ulterior
pronunciamento da ciência não é devidamente conhecido, ficando em consequência
muitas pessoas mal informadas sobre o assunto. É o que torna oportuno um
esclarecimento sobre o caso.
Procuraremos
primeiramente reconstituir a trama do episódio; depois, passaremos à sua
autêntica interpretação.
1. O relato do caso
Aos
29 de novembro de 1952, Morey Bernstein, honrado homem de negócios de Pueblo
(Colorado) nos Estados Unidos, deu início a uma série de experiências de
hipnotismo que o haviam de levar a resultados totalmente imprevistos.
Serviu-lhe de paciente a Sra. Virgínia Tighe (que no livro citado recebeu o
pseudônimo de «Ruth Simmons»), pessoa muito sensível às influências do
hipnotismo.
Que
se terá dado propriamente ?
Depois
de haver colocado a Sra. Ruth Simmons em estado de profundo sono hipnótico,
Bernstein ligou o seu gravador a fim de fixar fielmente a trama do diálogo que
ele estava para empreender com a paciente. A seguir, começou a sugerir-lhe
regressão no tempo, levando-a a descrever episódios ocorridos aos seus sete
anos de idade, aos cinco, aos três... Depois de haver feito Ruth atingir a
idade de um ano, pediu-lhe retrocedesse para tempos ainda mais remotos, desse
«o grande salto», e se esforçasse por descrever os locais e as cenas
correspondentes a uma vida anteriormente passada aqui na terra (destarte Bernstein
queria tentar uma experiência que ele mesmo nunca fizera, mas que ele sabia já
ter sido realizada por médicos, psiquiatras, engenheiros e outros técnicos do
hipnotismo).
Ruth,
de fato, rendeu-se à intimação e pôs-se a contar uma história nova, que ela foi
desenvolvendo em sucessivas sessões de hipnotismo, até completá-la;
entrementes, Bernstein e os demais observadores se admiravam grandemente:
Bridey Murphy (assim se teria ela chamado nessa vida anterior) haveria nascido
em Cork, na Irlanda, aos 20 de dezembro de 1798, como filha do casal Duncan
Murphy, advogado, e Kathleen Murphy. Habitavam em uma casa de madeira. Aos 17
anos de idade, conheceu o filho do advogado John MacCarthy, o jovem Brian
MacCarthy, com o qual se casou mais tarde, indo ambos residir em Belfast;
moravam perto de Dooley Road, numa pequena mansão frequentemente visitada pelo
Pe. John Goran, da igreja de Santa Teresa. Bridey comprazia-se então em tocar
lira, dançar o bailado irlandês chamado «jiga matinal» e jogar cartas (o jogo
dito «da fantasia»). Seu marido lecionava Direito na «Queen's University» de
Belfast e escrevia para o periódico «News-Letter» dessa cidade; Bridey
lembrava-se muito bem de que comprava sua roupa na loja «Cadenns House».
Enquanto falava, a paciente tomava sotaque genuinamente irlandês, usava de
expressões raras e típicas da Irlanda, de modo a não deixar dúvida de que
realmente estava revivendo episódios históricos. Finalmente narrou a sua morte,
ocasionada por um tombo; descreveu outrossim os seus funerais e a sua
existência subsequente no «astral», após a qual se teria de novo encarnado no
ano de 1923 nos Estados Unidos da América.
À guisa de
ilustração, transcrevemos aqui um dos trechos finais do diálogo de Bernstein
com Bridey Murphy:
«Prossigamos até o
tempo de sua morte... Você disse que assistiu aos seus próprios funerais. Viu
como a enterravam. Não é?
—
É.
_____ Bem. Se se
lembrava disso, deve lembrar-se também do ano em que morreu. Talvez o tivessem
marcado na cova ou numa lápide ou onde se costuma fazer. Provavelmente
presenciou isso. Em que ano foi?
_____ Foi... em mil
oitocentos... uhmmm... mil... um-oito-seis...quatro.
—
Um-oito-seis-quatro?
_____ Estava na
lápide... um-oito... creio... Vi um-oito-seis-quatro (1864).
—
Está vendo a lápide agora?
—
Estou.
—
Que diz ela ? Leia tudo o que está
escrito, além dos números. Que está escrito?
—
Ah... Bridget...
Kathleen.. uhmmm... M... MacCarthy...
—
Talvez os primeiros números lhe
possam dizer quando nasceu.
—
Um... sete... nove... oito.
—
Bem. Agora, que dizem os outros
números?
(Nesse ponto ela fez
um movimento com a mão, ao dizer «Há um traço»).
—
Um... Há um traço... um traço e
depois... um-oito-seis e quatro.
—
Está certo. Esqueçamos isso.
Descanse e relaxe o corpo.
Tão
minuciosas e verossímeis eram as informações fornecidas por Bridey Murphy a
respeito da sua «pré-vida» que os observadores se impressionaram. Resolveram
então enviar à Irlanda uma comissão de repórteres e peritos encarregados de
examinar até que ponto tais notícias podiam corresponder à realidade; os
resultados do inquérito deram a ver que, ao lado de elementos imprecisos ou
incoerentes, Bridey havia referido muitos dados que, de fato, eram fiéis à
realidade.
À guisa de
espécimes, citamos aqui os seguintes tópicos:
Bridey:
Teria nascido em Cork no dia 20 de dezembro de 1798, e morrido em Belfast num
domingo do ano de 1864.
Realidade:
Os registros irlandeses de nascimentos não são anteriores ao ano de 1864;
nenhum deles refere nascimento ou morto de Bridey Murphy. Também não se
encontrou diretório da cidade de Cork que mencionasse a sua família.
Poder-se-ia supor que. como esposa do um advogado, tivesse deixado um
testamento, coisa da qual não foi encontrado vestígio. Nem a imprensa de
Belfast noticiou a morte de Mrs. Bridey MacCarthy em 1864.
Bridey:
Raspei toda a pintura de minha cama... de metal, quando tinha 4 anos [1802].
Realidade:
Antes de 1850 não se usavam camas de metal na Irlanda.
Bridey:
Como criança, teria feito uma excursão a Antrim. «Aí há alcantis. A água corre,
as águas dos riachos correm rápidas e formam redemoinhos... quando chegam ao
mar... Os alcantis são realmente brancos».
Realidade
: Descrição notavelmente exata.
Bridey:
Ter-se-ia casado com Sean Brian MacCarthy.
Realidade:
Brian é o segundo nome do esposo atual de Virgínia Tighe (ou «Ruth Simmons»).
Bridey:
Brian teria sido professor de Direito na «Queen's University» de Belfast e
haveria escrito alguns artigos para o «News-Letter» dessa cidade.
Realidade:
A «Queen's University» só foi fundada em 1908; desde 1849 havia, sim, um
«Queen's College» em Belfast, mas nenhuma Faculdade de Direito. — Quanto ao
«News-Letter» de Belfast, existiu, mas em seus arquivos não se encontra artigo
algum de Brian.
Bridey:
Muitas vezes preparava para Brian «um bom prato irlandês» : um cozido de carne
de vaca e cebolas.
Realidade:
Tal prato só nos últimos cinquenta anos é comum na Irlanda; anteriormente, a
alimentação típica se preparava com toucinho e couve. •
Bridey:
Teria morado perto de Dooley Road. «Eu frequentava a igreja de Santa Teresa...
na rua principal... quase na esquina de Dooley Road».
Realidade:
Segundo John Bebbington, bibliotecário de Belfast, nunca existiu nessa cidade
uma dita «Dooley Road»; quanto à igreja de Santa Teresa, data de 1911.
Bridey:
Haveria comprado sua roupa no «Caddens House»; recordava-se até de ter pago
certa vez uma libra e seis pences por uma camisola.
Realidade:
Não se descobriu vestígio do «Caddens House»; na época pressuposta seria
acontecimento muito estranho vender-se uma camisola por preço tão elevado.
Bridey:
Referindo-se aos seus conhecimentos musicais, declarou que tocava a lira.
Realidade:
Richard Hayward, conceituado harpista irlandês, assegura que a lira nunca foi
conhecida na Irlanda.
Bridey:
Interrogada acerca dos nomes de algumas companhias de Belfast, declarou :
«Havia uma grande companhia de tecelagem. Sim, uma tabacaria...».
Realidade:
Com efeito, uma das mais importantes fábricas de cigarros de Belfast, Murray
Sons and Company. foi fundada em 1805; a «Belfast Ropework Company»,
constituída em 1876, formou-se de pequenas empresas que já tinham muitos anos
de existência.
Depois
de feitas as pesquisas na Irlanda, Bernstein houve por bem publicar o relato de
suas experiências com o enredo completo narrado por Bridey Murphy. Para o
operador e para a grande maioria de seus leitores, o caso parecia constituir um
dos mais lúcidos argumentos em favor da doutrina da reencarnação. O livro de
Bernstein («The Search for Bridey Murphy» — Em busca de Bridey Murphy)
propagou-se extraordinariamente: 170.500 exemplares foram vendidos em poucas
semanas, dando ampla margem a comentários em jornais, revistas, rádio e
televisão.
Em bom número de
cidadãos norte-americanos acendeu-se então o desejo febril de devassar os
limites do tempo presente e tomar conhecimento da respectiva vida anterior. A
revista «Life», em sua edição espanhola de 9 de abril de 1956, noticiava que
eram cada vez mais frequentes e populares as sessões de hipnotismo destinadas a
revelar as encarnações anteriores dos pacientes. Os hipnotizadores, em anúncios
de jornais, prometiam a cada cliente manifestar as respectivas existências
anteriores à atual, mediante o pagamento de 25 dólares por cada encarnação
desvendada.
Consta que por essa
época em Shreveport (Luisiânia) um rapaz de 17 anos hipnotizou uma jovem, a
qual conseguiu regressar dez mil anos de Sua existência!
Em Shawnee
(Oklahoma) um mancebo de 19 anos, Richard Swirik, resolveu suicidar-se com um
tiro, deixando a seguinte justificativa : «Sinto muita curiosidade acerca do
relato Bridey Murphy; por conseguinte quero ir investigá-lo pessoalmente».
(Notícias colhidas
na obra de B. Kloppenburg, O Reencarnacionismo no Brasil. Petrópolis 1961,
152s).
Todavia,
ao lado de tão entusiastas adeptos, havia também observadores e cientistas que
mantinham suas reservas em torno do caso «Bridey Murphy». Sabiam que o
hipnotismo, no decorrer da história, já apresentara semelhantes fenômenos de
regresso à «encarnação anterior», fenômenos que podiam, sem dúvida alguma, ser
explicados por impressões colhidas pelo paciente dentro dos trâmites mesmos da
vida corrente. Sendo assim, puseram-se a pesquisar atentamente o currículo de
vida juvenil de Virgínia Tighe e chegaram finalmente a uma explicação do caso
bem diferente da preconizada (veja-se a respeito o pronunciamento de abalizada
comissão de médicos e psicólogos que estudaram o caso na obra «A scientific
Report on 'The Search for Bridey Murphy'», edited by Milton V. Kline — The Julian
Press, Inc. New York, N. Y. 1956).
Mais
precisamente, pergunta-se, que descobriram os estudiosos ?
2. A genuína, interpretação
Em
Chicago o Rev. Wally White, pastor de um templo que Virgínia Tighe outrora
frequentava, aplicou-se à análise cuidadosa das circunstâncias da juventude
dessa paciente, conseguindo finalmente atingir as fontes de suas
«revelações»...
Verificou,
sim, que Virgínia, por muito tempo a partir dos seus sete anos de idade,
habitara em Chicago, do outro lado da mesma rua em que residia uma senhora
irlandesa denominada Bridie (não Bridey) Murphy Corkell; a jovem frequentava
assiduamente a casa dessa pessoa, que oferecia ambiente tipicamente irlandês,
onde Virgínia dançava a-«jiga» e declamava poesias regionais da Irlanda,
reproduzindo até mesmo a pronúncia e as expressões linguísticas dos habitantes
desse país; Virgínia aos poucas tornou-se mais e mais interessada por quanto
via e ouvia nesse meio irlandês, já que entrou em namoro com o filho de Bridie
Murphy Corkell, chamado João (Sean, em irlandês regional); no seu pretenso enredo
de encarnação anterior, «Bridey Murphy» chegava a dizer que se casara com Sean
MacCarthy! ... Ficou outrossim averiguado que aos sete anos de idade Virgínia
raspara realmente a pintura de sua cama, e em consequência fora severamente
punida (o que lhe causara, por certo, profunda impressão). Os peritos
reconheceram igualmente que muitos nomes de pessoas e lugares da Irlanda, assim
como certos episódios da vida na Irlanda descritos por Bridey Murphy no seu enredo,
haviam sido manifestados a Virgínia pelo contato assíduo que a jovem tinha com
a colônia irlandesa frequentadora da casa de Bridie Murphy Corkell. Assim
puderam os estudiosos chegar à conclusão de que os pormenores, por vezes tão
vivos e realistas, da «pré-vida» de Virgínia Tighe nada mais eram do que noções
adquiridas pela paciente no decorrer mesmo da vida atual, tornando-se então
inútil e arbitrária a explicação reencarnacionista.
A revista «Life»
(edição inglesa) de 6/VIII/56 encarregou-se da divulgação dos resultados dessas
novas pesquisas sobre o caso de «Bridey Murphy», esclarecendo assim a opinião
pública; o mesmo foi feito pelas «Seleções» no Brasil.
Em
consequência, a comissão de médicos e psicólogos norte-americanos mencionados
atrás exortava seriamente o público a não empreender nem tolerar a prática da
hipnose a mero título de divertimento. Os hipnotizadores autodidatas ou
amadores, ignorando o alcance da sua técnica, assim como a responsabilidade
moral que sobre eles pesa, podem facilmente deformar a personalidade de alguém,
incutindo-lhe atitudes mais ou menos permanentes de dupla personalidade, de
devassidão moral, de desequilíbrio mental, etc.
Assim
se desfez o sensacionalismo em torno do caso de Bridey Murphy. Resta agora
acrescentar algumas palavras acerca dos
3. Efeitos psicológicos da hipnose
É
oportuno lembrar que habitualmente a pessoa humana só utiliza uma oitava parte
(1/8) dos conhecimentos que ela adquiriu desde os seus primeiros anos de vida,
ficando sete oitavas partes (7/8) das noções que ela de fato possui, latentes
na sub- consciência. Ora a hipnose, tendo por efeito ligar as faculdades
superiores (principalmente as regiões do cérebro) responsáveis pelo controle habitual
da pessoa sobre si mesma, possibilita e provoca mesmo o emprego de conceitos
habitualmente encerrados na subconsciência do paciente; tais conceitos, por não
serem ordinariamente utilizados, uma vez trazidos à tona da consciência, fazem
que o paciente se comporte de maneira nova, imprevista, dando por vezes a
impressão de ser outra personalidade a desempenhar enredo dependente de épocas
históricas e circunstâncias geográficas bem diferentes das habituais.
Acontece que todo
indivíduo em estado hipnótico se torna particularmente dócil às sugestões
explicitas ou implícitas do operador. Comporta-se como criança
hiper-sugestionável, restaurando em si o funcionamento psicológico que lhe era
normal em sua primeira infância. Em consequência, o paciente tende a associar
entre si as figuras e representações (colhidas nesta vida mesma e guardadas na
subconsciência) que correspondam às insinuações do hipnotizador, desde que tais
insinuações não contrariem as convicções profundas da pessoa hipnotizada (em
caso de contrariedade ou choque, ela seria de tal modo abalada que sairia do
seu estado hipnótico). Em uma palavra, o paciente passa a aplicar todas as suas
aptidões naturais ao desempenho do rol que o operador lhe proponha: a memória
evoca recordações do passado, e a fantasia supre aquilo que a memória já não
recorda.
Tal pessoa poderá
então falar alguma língua estrangeira, língua que ela nunca aprendeu nem falou,
mas que ela ouviu em seus anos de infância ou juventude (embora disto nem se
lembre); subir-lhe-ão assim à consciência as impressões auditivas recebidas em
remota época e encerradas na subconsciência até tal momento. Da mesma forma, a
pessoa, caso seja pelo hipnotizador persuadida de ser poeta, poderá declamar
poesias, apesar de não ter veia poética própria (estará reproduzindo ou
combinando entre si versos percebidos anos atrás). Poderá outrossim fazer o
papel de criança, com sua voz e seu comportamento característicos;... as vezes
de ancião, a falar com pigarro, voz cansada e ritmo pausado, como se
antecipasse sua própria velhice.
Dada a atitude de
docilidade infantil em que a pessoa hipnotizada se acha, é assaz comum o
retrocesso na idade: o paciente tende a identificar o hipnotizador com alguém
que ele haja conhecido em sua infância;... descreve alguma festa de aniversário
seu, mencionando pormenorizadamente as crianças que tenham comparecido, as
brincadeiras e os jogos efetuados, os presentes recebidos, tudo como se o
paciente estivesse vendo o que descreve e sentindo as respectivas emoções...
Sabe-se outrossim
que os hipnotizados facilmente caem em estados de catalepsia (imobilidade) e
insensibilidade. Ora estas duas propriedades caracterizam igualmente o bebê nos
seus primeiros tempos; a criança recém-nascida, por exemplo, dorme
espontaneamente com os punhos cerrados e os braços estendidos por- cima da
cabeça durante longo espaço de tempo. Essa imobilidade parece ser consequência
remota da catalepsia em que o feto se encontra quando encerrado no seio materno.
É a escassa sensibilidade do feto que lhe permite tolerar as compressões, leves
contusões e operações cirúrgicas ocasionadas pelo parto e realizadas sem
anestesia. Note-se outrossim que, no caso de Bridey Murphy, o Sr. Bernstein,
após cada sessão, descrevia a Virgínia a maneira como ela reagira às sugestões
hipnóticas e dava-lhe a ouvir suas respostas gravadas na respectiva fita. Isto
só fazia excitar a fantasia da paciente, que naturalmente se via estimulada a
associar as suas reminiscências, a fim de continuar de maneira interessante o
enredo iniciado. Bernstein, por vias diversas, não deixava de sugerir a
Virgínia o que ele esperava; assim logo no início das experiências, tendo-a
feito regredir até a primeira infância, intimou-lhe: «Quero que sua mente
retroceda mais e mais... Há em sua memória outras cenas, de terras distantes e
lugares longínquos. Você poderá falar-me delas e responder às minhas
perguntas».
A provocação de tal
rebordosa no íntimo da personalidade não pode deixar de ser perigosa, como
notávamos atrás. Eis, a propósito, o depoimento do Dr. Walter C. Alvarez, da
Clinica Mayo Rochester, Minn., dos Estados Unidos:
«O hipnotismo, sobretudo quando praticado a
título de diversão, no palco ou na televisão, pode ter efeitos desastrosos.
Já citei o caso de uma jovem que,
completamente «embeiçada» pelo homem que a hipnotizara, começou a segui-lo por
todo o pais, dando-lhe quanto dinheiro conseguia apanhar. A família ficou
desesperada, mas não conseguiu chamá-la à razão.
Em outro caso semelhante, a família de uma
jovem hipnotizada num «show» de televisão informa-me que, cinco meses depois,
ela continua andando como que em transe. Está completamente mudada. Era alegre,
normal, com personalidade maravilhosa, grande vitalidade e muita afeição pela
família. Agora parece ter-se voltado contra esta: mostra-se «encrenqueira» e
difícil; age como se estivesse sempre temerosa de algo, sem saber de que.
Por sua vez, um jovem, altamente
inteligente e dotado, mas sempre um tanto excêntrico, diz-me que, desde que foi
hipnotizado — de brincadeira — por um leigo alguns anos atrás, nunca mais se
sentiu o mesmo. O hipnotizador meteu-lhe na cabeça umas idéias que desde então
o perturbam, forçando-o a proceder de maneira desagradável para si mesmo. Tem
passado estes anos em mãos de psiquiatras, que em vão tentaram vencer tais
compulsões».
A
Moral cristã não ignora os efeitos benéficos ou terapêuticos que a hipnose pode
exercer sobre certos pacientes. Por isto reconhece a legitimidade de sua
aplicação desde que
- haja evidente
indicação médica.
- seja o operador
idôneo na sua técnica e dotado de consciência moral íntegra,
- esteja presente
uma ou outra testemunha que garanta a honestidade do tratamento e possa
dissipar qualquer dúvida a respeito do mesmo.
Dom Estêvão Bettencourt (OSB)