PERGUNTE e RESPONDEREMOS 042
– junho 1961
PROMOÇÃO
DE MULHERES AO SACERDÓCIO
DOGMÁTICA
GERALDO (Rio de
Janeiro): «Na Suécia, o Sínodo Luterano e o
Parlamento resolveram promover as mulheres ao sacerdócio (luterano). Este
exemplo não merecerá ser imitado em outros países, mesmo entre católicos?»
Aos 10 de abril de
1960, domingo de Ramos, três mulheres, Margit Sahlin, Elizabeth Djurle e Ingrid
Presson, foram instituídas «sacerdotisas» das comunidades luteranas da Suécia.
Este fato punha termo final a um movimento anterior assaz agitado, no qual as
autoridades luteranas e o Parlamento (Riksdag) tiveram íntimas partes (sabe-se
que a Igreja Luterana na Suécia é Igreja Oficial ou do Estado).
Já em 1920 se
tratou publicamente de dar o sacerdócio luterano às mulheres naquele país
setentrional; contudo, a opinião geral não estando preparada para acolher tal
inovação, o projeto não foi adiante.
Em 1946, a questão
tornou-se de novo atual, merecendo mais e mais a atenção de teólogos luteranos,
parlamentares e civis, que manifestaram opiniões divergentes sobre o assunto. Em
1955 o Parlamento começou a estudar um projeto de lei que autorizava o acesso
das mulheres ao sacerdócio. Todavia o Sínodo Luterano da Suécia, usando de
plenos direitos seus, opôs o veto a essa tentativa, por 62 vozes contra 36 (12
de outubro de 1957). Diante de tal atitude, a opinião pública se levantou em
solene protesto: os movimentos feministas da nação, em nome de seus 800.000
membros, desencadearam ampla atividade para reivindicar o debatido favor, não
se contentando com substitutivo algum que, embora desse à mulher mais
iniciativa na igreja do que antes, não chegasse a equiparar a mulher ao varão
no exercício do sacerdócio. A pressão foi tal que o Parlamento resolveu
recomeçar o estudo do projeto de lei: convocou mais uma vez o Sínodo Luterano,
o qual finalmente houve por bem aprovar a inovação por 69 vozes contra 29, aos
27 de setembro de 1958. Como se compreende, mesmo após este alvitre as opiniões
não se acalmaram; formou-se em novembro de 1958 a «Frente Confessional», a qual
considerava a nova lei como indevida acomodação aos caprichos do Governo e à
mentalidade naturalista moderna.
Tal
medida chama realmente a atenção pois,
nos países escandinavos em geral, o Cristianismo, sob a forma luterana,
(rejeitando decididamente o calvinismo), conservou muitas das suas leis e
observâncias tradicionais: os luteranos, par exemplo, ainda têm sua hierarquia
de arcebispos, bispos e presbíteros; a arquitetura de uma igreja luterana
assemelha-se muito à de um templo católico, até mesmo no tocante ao altar e à
sua posição; os trechos de epístolas e Evangelhos lidos no culto dominical
luterano são muitas vezes os mesmos que ocorrem contemporaneamente na Liturgia
católica... Diz-se, aliás, que o rei Gustavo I Wasa (1523-1560), sob o qual se
introduziu a «Reforma» na Suécia, teve que lutar tão energicamente contra os
inovadores calvinistas como contra Roma!
Pergunta-se então:
que fatores terão motivado a tão revolucionária medida de setembro de 1958 na
Suécia? Será um autêntico desabrochar das riquezas do Cristianismo ou antes um
desvio reprovável?
Para chegar à
conclusão adequada, analisaremos abaixo sumariamente os argumentos debatidos pelos
teólogos na controvérsia: 1) a doutrina do Novo Testamento; 2) Feminismo
naturalista e Feminismo cristão.
O
sacerdócio feminino já foi focalizado num plano mais especulativo em «P.R.»
1/1957,
qu. 4. As considerações abaixo completarão o que aí foi dito.
1.
A doutrina do Novo Testamento
Mais de uma vez os
teólogos luteranos suecos, em nome da S. Escritura, rejeitaram o sacerdócio das
mulheres.
Um
dos pronunciamentos mais notáveis deu-se em 1951: sete dentre oito professores
de Exegese do Novo Testamento das Faculdades de Lund e Upsala entregaram à
imprensa um comunicado declarando que «a promoção de mulheres ao sacerdócio na
Igreja seria inconciliável com as concepções do Novo Testamento e constituiria
uma infidelidade à Escritura Sagrada».
E quais terão sido
as razões precisas evocadas no caso?
Reduzem-se a duas:
a) a escolha dos Apóstolos ; b) o mandamento do Senhor citado por São Paulo em
1 Cor 14,37. Vejamo-las de per si.
a)
A escolha dos Apóstolos
A atitude de Jesus
para com as mulheres é algo de inédito no ambiente judaico e grego em que o
Senhor viveu ; de fato, Cristo atribuiu a ambos os sexos os mesmos direitos e
as mesmas obrigações perante Deus (haja vista Mt 18,3 : «fazer-se
espiritualmente como criança»; Mt 19,5: «dois numa só carne»; Gál 3,28: «nem
judeu, nem grego; nem servo, nem livre; nem varão, nem mulher»). Quando, porém,
quis escolher os Apóstolos, que haveriam de continuar a sua obra, Jesus só
escolheu varões. De modo particular, a intenção do Senhor aparece na última
ceia: só os Apóstolos foram admitidos a esta, embora estivessem presentes na
Cidade Santa mulheres do círculo de colaboradores assíduas de Cristo (cf. Lc
8,1-3). A praxe judaica reconhecia a mulheres e crianças o direito de
participarem da ceia de Páscoa; Jesus, não obstante, derrogou a esse costume.
Entregou apenas aos Apóstolos a Eucaristia e o poder de a celebrar futuramente
nas, assembleias de culto (cf. Lc 22,14-20); reservou também aos varões as
incumbências de pregar, conferir o batismo (cf. Mt 28,19s) e administrar o
poder das chaves (cf. Jo 20,19-23); de resto, confiou aos Apóstolos não somente
a função de pregadores, mas também a de chefes do povo de Deus, encarregados de
representar o Senhor após a sua partida (cf. Mt 18,18; 19,27-29; Lc 22,27-30).
Ora, já que não se veem
razões nem de necessidade prática, nem de conveniências, que justifiquem a
limitação da escolha feita por Jesus, conclui-se que, no caso, o Senhor
estabelecia um princípio ou uma norma independente de circunstâncias
históricas.
A
escolha do Senhor bem pode ser ilustrada pelo fato de que Cristo queria fazer
dos seus escolhidos os seus representantes através dos séculos (cf. Mt 28,19s).
Ora é muito rica a noção judaica de «representante», shaljach: designa um
mandatário dotado dos mesmos direitos e poderes que tocam ao mandante.
Supondo-se tal conceito na mente de Jesus, deve-se dizer que há continuidade
entre o ministério de Jesus e os diversos encargos confiados aos Apóstolos e
aos seus sucessores. Além disto, note-se que no Novo Testamento o ministro de
Cristo não é apenas lugar tenente do Senhor (em virtude de uma instituição
jurídica), mas ele também simboliza (por traços de semelhança ou afinidade) o
Senhor Jesus (na epístola aos Hebreus e no Apocalipse a liturgia terrestre é
apresentada como imagem da Liturgia celeste): ao desempenhar as suas funções
sacerdotais, o ministro do altar é, portanto, uma imagem do Senhor; é Cristo
que nele e por ele consagra o pão e o vinho, perdoa os pecados, derrama a graça
santificante no batismo e nos demais sacramentos ...
E São Paulo nota
bem que, para representar o Cristo, só o varão é diretamente apto; à mulher
toca representar ou refletir a dignidade do varão, indiretamente a de Cristo:
«O
chefe de todo varão é Cristo; o chefe da mulher é o varão... O varão é a imagem
e o reflexo de Deus (Cristo); quanto à mulher, é o reflexo do varão. Em
verdade, não o varão foi tirado da mulher, mas a mulher é que foi tirada do
varão. O varão não foi criado para a mulher, mas a mulher é que foi criada para
o varão. Sendo assim, deve a mulher... ter sobre a cabeça o sinal de submissão»
(1 Cor 11,3.7-10).
Mais ainda: na
epístola aos Efésios, c. 5, referindo-se ao matrimônio, São Paulo distribui com
exatidão as funções de «representar»: no lar, quem representa Cristo, desempenhando
consequentemente o papel de chefia, é o marido; quanto à esposa, ela é
revestida também de grande dignidade, dignidade porém, de representante da Igreja (cf. Ef
5,22-32).
Destas
considerações alguns luteranos mesmos da Suécia (inclusive mulheres que
entraram nos debates) depreenderam claramente que o ministério sacerdotal não
poderia ser estendido às mulheres. Muito significativas são, por exemplo, ais
palavras de Magda Wollter:
«Os
Apóstolos, como se compreende, não se tornam o Cristo; eles apenas O
representam. Contudo a mera ideia de que uma mulher possa representar um homem
já por si parece estranha, desde que haja varões que o possam fazer. O caráter
masculino de Cristo aparece de modo particular em certos aspectos da
representação, como sejam a celebração da ceia e a refeição pascoal»
(Annorlunda, texto citado por F.-R. Refoulé, Le problème des femmes-prêtres en
Suède, em «Lumière et Vie» VII 43, pág. 66).
b) O mandamento do Senhor
Em
1 Cor 14, São Paulo exorta:
«Como se faz em todas as igrejas dos
santos, estejam caladas as mulheres nas reuniões, pois não lhe é permitido
falar (lalein). Devem estar submissas, conforme diz a Lei. Se quiserem
esclarecimentos sobre algum ponto, perguntem a seus maridos em casa, pois é
indecoroso para a mulher falar em assembleia...» (33-35).
Ao
que o Apóstolo acrescenta: «Se alguém julga ser profeta ou possuir dons
espirituais, reconheça, nas coisas que vos escrevo, um preceito do Senhor» (v.
37).
A proibição de
falar não pode visar apenas a tagarelice, pois esta nem ao varão é lícita. O
verbo grego lalein, utilizado por São Paulo, tem sentido quase técnico no
epistolário do Apóstolo, designando a pregação ou o ensino da Palavra de Deus.
Em 1 Cor 14,34, portanto, o santo quer lembrar às mulheres não lhes ser lícito
exercer uma função que Cristo certamente confiou aos seus ministros. Esta
interpretação é confirmada por um confronto com os dizeres do Apóstolo em 1 Tim
2,11s:
«Durante
a instrução, a mulher deve ficar em silêncio, com inteira submissão. Não
permito que a mulher ensine ou tenha domínio sobre o varão; deve permanecer em
silêncio».
Para corroborar a
sua exortação, o Apóstolo em 1 Cor 14 faz questão de dizer que ela representa
uma ordem do Senhor Jesus mesmo. Aliás, em toda esta epístola São Paulo costuma
distinguir entre as prescrições ou as recomendações que ele dá com a sua
autoridade de Apóstolo, e as que ele transmite qual mero arauto de Cristo;
veja-se 1 Cor 7,10.12.25; 9,14; 11,23; cf. também 2 Cor 8,10. Donde se
depreende que, ao evocar em 1 Cor 14,37 a ordem do Senhor, São Paulo tenciona
dar autoridade absoluta à proibição formulada nos versículos anteriores.
É o que perceberam
também vários dos teólogos luteranos suecos.
2.
«Feminismo» e Feminismo
Os
exegetas que não quiseram reconhecer o alcance dos textos bíblicos acima
citados, apelaram para o fato de que nem todas as admoestações da Bíblia gozam
de igual autoridade e valor; existem prescrições escriturísticas referentes não
a dogmas, mas a disciplina, formuladas em vista de determinadas pessoas ou
circunstâncias, destinadas a vigorar por tempo limitado, etc. Em particular, no
tocante à posição da mulher na sociedade, seja civil, seja religiosa, dizem que
o Novo Testamento supõe uma ordem de coisas hoje em dia superada ou anacrônica,
ordem de coisas, portanto, que a sociedade cristã já não pode observar ao pé da
letra; de modo especial, São Paulo teria sido influenciado por sua formação
rabínica e pelas concepções patriarcais do judaísmo pré-cristão.
Positivamente,
apelaram para o fenômeno moderno chamado «feminismo», que tende a emancipar
totalmente a mulher, dando-lhe solene equiparação com o homem. Principalmente
na Suécia tal movimento se tem acentuado: lá se encontram mulheres em quase
todas as profissões e tarefas, inclusive na de guarda civil... Seria então a
Igreja a última instância a reconhecer a dignidade da mulher assim expressa?
Houve também quem apontasse para vantagens de apostolado: a mulher
«sacerdotisa» poderia executar melhor certas funções junto a outras mulheres,
junto a crianças, ou em hospitais, em cárceres, etc. Em conclusão, nada
justificaria que, em pleno séc. XX, as mulheres não pudessem ter acesso, como
os varões, ao ministério sacerdotal. Foi a razão principal, se não única, que
moveu apaixonadamente a opinião pública sueca em favor da inovação...
2.1.
Que se poderia dizer diante de argumentação, à primeira vista, tão justa e
sensata?
a) A atitude do
Senhor, que inspirou a do Apóstolo São Paulo e a das subsequentes gerações
cristãs até hoje, não parece, como já notamos oportunamente, depender de
preconceitos patriarcais ou antifeministas, mas, sim, de um princípio geral ou
de uma valorização do varão e da mulher não sujeita, a circunstâncias de época
e local.
De
resto (e isto alguns luteranos mesmos o reconhecem) quem, por conta própria,
tenta discernir a letra (elemento passageiro, acidental) e o Espírito (elemento
perene, essencial) da S. Escritura, arrisca-se a desviar-se ou a deixar-se
influenciar por noções heterogêneas, quiçá pelos conceitos sociais e morais da
nossa época; atribui então à S. Escritura o que ela não quer dizer, em vez de
deduzir dela a genuína mensagem. Não é fácil, em se tratando da conduta da
mulher, distinguir entre o que é ensinamento divino universal e o que é costume
social de certa época, sujeito a evoluir.
b) Estas
advertências são corroboradas pela consideração do que vem a ser o feminismo
autêntico, inspirado tanto pela ordem natural das coisas como pela S. Escritura
mesma.
Em verdade, Deus
fala aos homens não apenas pela Bíblia, mas também pela ordem natural das
coisas ou pela criação. Ora o Criador fez o ser humano em dois sexos: o
masculino e o feminino. Quaisquer que sejam a época, a região e as modas
sociais em meio às quais um indivíduo venha a nascer, cada qual possui desde a
sua origem, antes mesmo de abrir os olhos ao mundo, um corpo de varão ou de
mulher, dotado de funções próprias. Tal corpo, com as suas capacidades
individuais de agir e reagir, vem a ser o grande sinal das intenções de Deus a
respeito de cada um de nós.
Justamente um dos
grandes méritos da psicologia moderna foi o de mostrar o nexo íntimo e a mútua
dependência do físico e do psíquico no ser humano. Isto quer dizer, em última
análise, que o varão não se realiza plenamente se não procurando desenvolver
cada vez mais o que ele tem de tipicamente viril ou tornando-se cada vez mais
varão; vice-versa, a mulher só se consuma desdobrando progressivamente a sua
entidade característica de mulher, não... tornando-se masculina.
Ora poder-se-ia
assinalar alguma característica que defina em linhas gerais cada um dos dois seres?
Sim. O corpo
masculino, em uma palavra, significa a iniciativa (é ao varão que compete
iniciar, desencadear, comunicar); correspondentemente, o corpo feminino,
«vis-à-vis» do corpo masculino, significa a receptividade, a acolhida e,
consequentemente, a interioridade que fecunda com respeito e ternura o dom
recebido do varão. Isto não quer dizer que a mulher não tenha iniciativas a
tomar, mas, sim, que mesmo as suas iniciativas serão, de perto ou de longe,
norteadas pela sua vocação fundamental a receber e acolher: «A interioridade
parece ser realmente a dimensão... que caracteriza de maneira especial a
mulher», observa a escritora francesa Michele Aumont (La chance d'être femme.
1960, pág. 242).
Disto se depreende
que não pode concorrer para o bem da mulher a tendência a equipará-la em tudo
ao varão ou a fazer dela como que uma duplicata do homem na sociedade; a mulher
que queira entrar em concorrência cega e indistinta com o homem nos setores da
profissão, da política, da camaradagem e da amizade, tal mulher acaba perdendo
o que a caracteriza como mulher na sociedade — o que não se dá sem detrimento
para ela mesma e para o bem comum. Emmanuel Mounier, ao reproduzir recentemente
impressões de uma viagem à Escandinávia, observava que o comportamento quase
indiferenciado de homens e mulheres na Suécia tornava «a mulher sueca... mais
infeliz do que ela mesma frequentemente reconhece» (Notes scandinaves, em
«Esprit», février 1960, pág. 283).
Estas considerações
dão suficientemente a ver que, qualquer que seja a evolução da sociedade, a
conduta do varão e da mulher jamais será dependente simplesmente das leis ou
das concepções humanas; o corpo humano e suas funções biológicas (que são
verdadeiros sinais pelos quais se manifesta a personalidade) não poderão ficar
sem significado; em particular, o corpo da mulher deverá caracterizar as
modalidades de «emancipação» da mulher na sociedade.
2.2.
Estas verdades, que pertencem ao setor meramente natural, são corroboradas e
altamente valorizadas pela ideologia cristã. Com efeito; o Cristianismo vê no
comportamento típico da mulher um símbolo muito rico — o símbolo da atitude
receptiva que compete a toda criatura frente ao Criador; a qualquer indivíduo
humano toca, sim, o papel de receber aberta e generosamente os dons de Deus, a
fim de os guardar e deixar desabrochar numa atitude de reverência e ternura. É
esse papel espiritual que a mulher, por sua natureza física mesma, simboliza.
Esse papel, Maria SSma., Mãe de Cristo, o realizou por excelência; ele se
prolonga na Igreja, metaforicamente apresentada por S. Paulo como mulher ou
como Esposa de Cristo isenta de mancha ou ruga (cf. Ef 5,27). — Não é, pois,
sem motivo que os feministas modernos geralmente «ignoram» (ou não reconhecem)
as posições de Maria SSma. e da Igreja dentro da ideologia cristã.
Assim a mulher é,
para o cristão, como que um «vis-à-vis» de Deus; ela significa uma
personalidade (ou, mais amplamente, ela significa a alma humana) chamada a
dialogar com Deus numa atmosfera de amor. Essa função da mulher ou esse seu
valor simbólico está longe de implicar humilhação ou degradação para a mulher;
implica, antes, uma função extremamente rica ou digna: a mulher, por sua
constituição psicossomática, representa na sociedade cristã não o Cristo, mas a
Igreja,... a Igreja que gera o Cristo nas almas.
Quanto à função de
representar o Cristo, Esposo, ela tem que ficar naturalmente reservada ao varão;
a este por instituição da natureza e por disposição explícita de Jesus, é que
se deve abrir o acesso ao ministério sacerdotal, ministério pelo qual Cristo
continua sua atividade de Chefe ou de Comunicador da vida sobrenatural que as
almas deverão fecundar dentro de si.
Eis aí a razão mais
profunda pela qual tanto a Escritura Sagrada como o ensinamento antigo e atual
da Igreja se opõem à promoção das mulheres às funções sacerdotais. Longe de
significar mentalidade arcaica, esta posição negativa vem a ser precisamente a
garantia necessária para que a mulher possa mais e mais afirmar as riquezas de
sua índole feminina, sem, porém, se desvirtuar.
3.
Reflexão final
Notam
os observadores que a inovação instaurada na Suécia tende a se generalizar por
toda a Escandinávia: na Dinamarca, aliás, já foi introduzida há alguns anos,
embora com menos alarde; na Noruega, a lei de acesso das mulheres ao sacerdócio
luterano já foi votada e aprovada pelos poderes públicos, aguardando-se apenas
a sua execução; quanto à Finlândia, não se vê como poderia ficar alheia ao
movimento. Os progressos da inovação vão causando mal-estar e divisões entre os
próprios cristãos luteranos dessas e de outras nações, pois muitos consideram a
nova praxe como clamorosa derrogação aos princípios formulados pela S.
Escritura. A este protesto os inovadores respondem, como vimos, asseverando que
o Senhor, os Apóstolos e os antigos cristãos só excluíram do sacerdócio as
mulheres por motivos acidentais de mentalidade, de estrutura social..., motivos
que têm de ceder às circunstâncias da vida moderna.
Diante de tal
situação, aflora-nos espontaneamente a questão: afinal quem será capaz de dizer
de que lado está a autêntica interpretação da S. Escritura ? Quem estará
habilitado para distinguir, sem desvirtuamento, o que na S. Bíblia é proposição
essencial, intangível aos homens, e o que é acidental, condicionado por
circunstâncias históricas transitórias?
Não se vê como
responder a tais questões a menos que se admita um magistério infalível dentro da
Igreja, a quem Cristo assiste (como Ele mesmo prometeu em Mt 28,19), magistério
mediante o qual os fiéis possam sempre interpretar genuinamente a S. Escritura,
evitando todo desvio, seja para a direita, seja para a esquerda.
Assim o problema do
acesso das mulheres ao sacerdócio leva a focalizar um tema ainda mais central e
importante, ou seja, o princípio de que «só a Escritura constitui fonte de fé».
O impasse criado no caso que acabamos de analisar, bem mostra que tal princípio
é falho, é
portador dos germens de dissolução de que
mais e mais se vem ressentindo a Reforma iniciada no séc. XVI.
Pelos frutos se
reconhece a árvore... Assim pelas tristes consequências se reconhece a
precariedade do princípio.
Seja esta a
conclusão a que cheguem os cristãos envolvidos nos debates do sacerdócio
feminino!
Dom
Estêvão Bettencourt (OSB)