PERGUNTE E RESPONDEREMOS 385/junho 1994
Reflexões
RICO
EM MISERICÓRDIA
(Ef 2,4)
O
mês de junho é, pela piedade católica, dedicado ao Sagrado Coração de Jesus.
O
coração vem a ser, para os semitas, o
símbolo do amor. . . e do amor compassivo,
misericordioso, como só Deus o pode ter. — Para
exprimir a misericórdia-compaixão, a Escritura usa a palavra hebraica rahamim;
esta significa a adesão espontânea de uma pessoa a
outra. Tem sua sede no seio materno (rehem),
como insinua o caso da mulher cujo filho o rei Salomão
mandou partir ao meio: "Suas entranhas se comoveram por causa do
filho".. Também tem sede nas entranhas de um pai, com se depreende de Jr
31, 20: "Minhas entranhas se comovem por Efraim,
por ele transborda minha ternura" ... ou
ainda nas entranhas de um irmão: "José apressou-se em sair, porque suas
entranhas se comoveram por seu irmão Benjamim e as lágrimas lhe vinham aos
olhos" (Gn 43,30).
A
misericórdia de Deus, no Antigo Testamento, é associada a outra atitude do
Senhor, expressa pelo hebraico hesed, que significa também piedade, mas
inclui a idéia de fidelidade. Isto quer dizer que o amor de Deus para com os
homens não é algo de passageiro ou ilusório, como o amor dos homens, mas é
firme e lúcido como só em Deus pode existir. Ele pode dizer com toda a razão:
"Forte como a morte é o amor. . . As águas da torrente jamais poderão
apagar o amor, nem os rios afogá-lo. Quisesse alguém dar tudo o que tem para
comprar o amor. . . seria tratado com desprezo" (Ct 8,6s).
O
vocábulo português misericórdia (derivado do latim) faz ressoar o pensamento
dos semitas. Com
efeito; misericórdia significa "ter um coração (cor, cordis) voltado para
a miséria ou capaz de entender o mísero e a criatura frágil".
Assim
se vê que a revelação que Deus faz de Si nas Escrituras Sagradas, longe de sugerir
a figura de um Deus irado e justiceiro, é, mesmo no Antigo Testamento,
altamente reconfortante. Traz-nos
a imagem do pai e da mãe, que amam seus filhos, porque lhes querem bem,. . . e
amam com aquela paciência e longanimidade
que definem o genuíno amor, o amor que não volta
atrás, pois Deus não pode ser Sim e Não ao mesmo tempo (cf 2Tm 2,13).
Ora,
o Coração de Jesus, cultuado especialmente depois que
o jansenismo nos séculos XVII/XVIII quis incutir a
idéia de um Deus distante dos homens, é o símbolo do amor de Deus, que, para se
doar às criaturas, quis pulsar através de um coração humano assumido no seio de
Maria Virgem. Todos os anos Ele convida as suas criaturas a repensar sobre a
verdadeira face de Deus; Ele espera o filho pródigo de braços abertos (cf. Lc
11-32); Ele espera com paciência que a figueira estéril dê frutos, mesmo depois
de três anos de esterilidade (cf. Lc 13,5-9)!
E.B.