PERGUNTE E RESPONDEREMOS
545 –
novembro 2007
Na ordem do dia:
TEOLOGIA DA
PROSPERIDADE
"A teologia da
prosperidade está mesmo funcionando para os líderes, eles, sim, estão cada vez
mais ricos".
Ariovaldo
Ramos Presidente da Visão Mundial no Brasil
Com
gratidão ao autor, publicamos, a seguir, um artigo do Pe. Inácio José do Vale,
Professor de Teologia Sistemática na Faculdade de Teologia de Volta Redonda
(RJ).
O
poeta alemão, Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), autor da mais célebre das
versões do mito de Fausto, o homem que vende sua alma ao demônio em troca da
suprema excelência em sua profissão, e também por alguns prazeres especialmente
o de administrador do ducado de Wilmar durante anos, de modo que, quando
acrescentou em 1832, no fim da vida, alguns capítulos novos de Fausto, que
começou a escrever sessenta anos antes, aplicou lições que aprendeu em sua
experiência como espécie de autoridade monetária.
Num
desses capítulos novos, há uma cena antológica, e de exame obrigatório nas
escolas de economia "Mefistófeles se apresenta ao imperador, numa
terça-feira de Carnaval, e o encanta com as maravilhas do papel-moeda".
Embevecido,
o imperador ordena a seus artesãos que multipliquem os tais papéis, que
circulam, "rápidos e festivos como raios de primavera", trazendo
prosperidade, desenvolvendo para o reino, porém, apenas de forma fugaz. Tudo
era falso como as fantasias de Carnaval e de Mefistófeles. Segue-se a inflação,
a crise e o sofrimento. O imperador havia sido enganado, com Fausto, ao abdicar
de valores permanentes, a alma, em troca de realizações efêmeras ([1]).
Estamos
vivendo a era religiosa de Fausto. Muitos líderes religiosos estão vendendo a
alma ao demônio do dinheiro, da ganância e da fama em troca da luxúria e do
poder terreno. É a inversão dos valores éticos da teologia Apofática e
Teândrica pela Teologia da Prosperidade.
Nossa
era está sendo marcada por uma prática religiosa escandalosa sem precedente.
Estamos vivendo a era de falsas teologias, de efêmeras igrejas, de pastores
fugazes e de crentes desvalorizados. Esse tipo de religiosidade é pior que
reality shows.
Como
disse Ariovaldo Ramos: "A Igreja evangélica brasileira está sendo alvo
de várias tentativas de golpe e não pode capitular à ganância dos maus pastores
que veem nela um trampolim para a riqueza, para a fama e para o poder; à
ganância dos que nela veem um mercado a ser desenvolvido e explorado"
([2]).
O
Bispo e teólogo Robinson Cavalcanti disse: "Creio ter vindo o suficiente
para presenciar o 'crescimento decadente' do protestantismo brasileiro - seu
abandono, quase por completo, das fontes reformadas; sua adoção e práticas do
pragmatismo secular, a intolerância do exclusivismo fundamentalista; e a
suprema ironia da adoção de pontos de vista católico-romanos, quando mais alta
seja a retórica da sua pregação" ([3]).
Na
década de 60, surge nos Estados Unidos a filosofia da prosperidade através dos
ensinos budistas e taoistas. O filósofo Dr. Essek W. Kenyon (1867-1948), foi o
mentor de transportá-la para o meio cristão. Na década de 70, a filosofia da
prosperidade virou teologia da prosperidade. Tendo como seu maior expoente o
pregador americano Kenneth Hagin.
A
cantora americana pop-star Madonna disse: "Nós, americanos, somos
obcecados por valores totalmente errados, como ser bonito, ter dinheiro no
banco, ser bem sucedido".
O
pensamento de Madonna define muito bem a teologia da prosperidade. E de maneira
mais completa a do psicanalista inglês Adam Phillip, “No século XIV, se as
pessoas fossem interrogadas sobre o que queriam na vida, diriam que buscavam a
salvação divina. Hoje a resposta é ‘ser rico e famoso’. Existe uma espécie de
culto que faz com que as pessoas não consigam enxergar o que realmente querem
da vida”.
O
apóstolo São Paulo disse: 'Tende cuidado, para que ninguém vos faça presa sua,
por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens segundo
os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo" (Cl 2.8).
O
ensino da teologia da prosperidade que o crente não adoece e tem o poder de
conseguir tudo por determinação e decreto, é puro engano e heresia. Tal ensino
não é segundo Cristo e sim segundo a esperteza de falsos pastores. (Is 56.11;
Fl 3.2; Ap 21, 8).
O
ensino do Nosso Senhor Jesus Cristo para os verdadeiros pastores e cristãos é,
segundo o grande teólogo suíço Urs Von Balthasar (1905-1988), "uma decisão
por Cristo que comporta inelutavelmente a aceitação da morte e do martírio. O
cristão se engana e é infiel à sua fé se não concebe a vida como uma resposta
de amor ao amor divino que se manifesta em sua glória através do Kenosis sobre
a cruz. É a cruz que nos torna plenamente disponíveis à missão de estabelecer o
reino de Cristo em meio aos homens" ([4]).
Para
os verdadeiros seguidores de Jesus Cristo, as beatitudes de Mt 5, 1-12 são
suficientes para a glória do martírio.
Estamos
vivendo uma crise moral em todos os contextos sociais. É muito triste essa
crise na igreja legitimada pela teologia liberal e da prosperidade. Luiza Nagib
Eluf, procuradora da Justiça e autora de A Paixão no Banco dos Réus disse:
"Estamos num mundo que valoriza a ostentação,o consumismo desenfreado
e neurotizante. Se não há outros valores que não sejam o dinheiro e a
gratificação imediata, pelo consumismo ou pelo sexo, não se pode esperar
respeito por nada ou por ninguém" ([5]).
Ultimamente
muitas organizações e até pessoas começaram a utilizar um método muito
eficiente de proselitismo: o "evangelho do enriquecimento". Muitas
igrejas, pregadores, esotéricos e afins dizem: "Vem para cá e tu ficarás
rico"; ou "ouve os testemunhos". Então é elencada ostensivamente
uma relação de bens adquiridos.
É
o que Ari Pedro Oro, autor do livro "Avanço Pentecostal e a Reação
Católica" (Editora Vozes Ltda., Brasil) chama "Teologia da Prosperidade";
e de efeito multiplicador. A "Teologia da Prosperidade" é uma tática
de proselitismo extremamente eficiente e tentadora porque vai no ponto
vulnerável: o consumismo, a vaidade. A indústria moderna põe no mercado bens
que a população, de mentalidade consumista, geralmente não consegue adquirir.
Esta demanda reprimida é que faz com que os pobres vislumbrem nesta versão do
evangelho uma possibilidade de satisfação individual, até mesmo pela influência
dos testemunhos televisionados. É apresentado um Deus mercador da felicidade,
um Jesus na forma de gênio da lâmpada. A ideia de "efeito
multiplicador", conforme chama Ari Pedro Oro, é um chamariz
eficientíssimo. Lembra-nos a prática dos sacrifícios pagãos, que eram feitos em
troca de alguma vantagem.
Este
efeito assemelha-se a uma hipotética aplicação financeira mais rentável do que
as concorrentes: as pessoas venderiam seus bens para ali aplicar. As Igrejas
tradicionais pediam dinheiro e estimulavam o dízimo, contudo não criavam nos
contribuintes a expectativa de que as suas contribuições os fariam ricos. As
novas igrejas conseguiram conciliar a ganância material dos crentes com seus
anseios espirituais: o mesmo que faziam os adoradores do Deus pagão Mamom. As
suas orações e suas ofertas são quase uma transação comercial. Deram um
respaldo espiritual ao materialismo: estimulando à semelhança de Satanás que
ofereceu o mundo a Jesus (Mt 4, 8-11). Os testemunhos televisionados,
referentes ao enriquecimento para estimular a cobiça dos crentes, servem também
para "massagear-lhes o ego" (dizendo "você merece ficar
rico") (6).
Para
uma meditação abissal:
"Mas
é grande ganho a piedade com contentamento. Porque nada trouxemos para este
mundo, e manifesto é que nada podemos levar dele. Tendo, porém, sustento, e com
que nos cobrimos, estejamos com isso contentes. Mas os que querem ser ricos
caem em tentação e em laços, e em muita concupiscência louca e nociva, que
submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor ao dinheiro é a raiz de
toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e com muitas
dores" (1Tm 6, 6-10).
Pe.
Inácio José do Vale
Dom Estêvão Bettencourt (OSB)