Guardar a fé, o serviço de Bento XVI
Publicado em
19/04/2012 | Jorge Ferraz
“Não anunciamos teorias nem opiniões privadas, mas a
fé da Igreja da qual somos servidores”, disse na última Quinta-Feira Santa o
Papa Bento XVI, que na segunda-feira completou 85 anos de idade e, hoje,
comemora sete anos de pontificado. Ele respondia a um manifesto de padres
europeus que solicitava, entre outras mudanças na Igreja, a ordenação de
mulheres e a possibilidade de divorciados casados em segundas núpcias receberem
a Eucaristia.
A idade avançada do Papa faz com que não falte nem
mesmo quem insinue – com ares de exigência – que Bento XVI deveria renunciar
por não estar mais em condições de governar a Igreja Católica do terceiro
milênio. Mas, no último domingo, Bento XVI tornou a pedir que os católicos
rezassem por ele, a fim de que ele cumpra a missão que lhe foi confiada. Parte
desta missão é o combate ao relativismo, a noção de que valores e verdades são
maleáveis de acordo com o tempo e o local. Esta mentalidade permeia tanto o
mundo moderno como o interior da própria Igreja, como atesta o Apelo à
Desobediência a que o Papa respondeu na Semana Santa.
O papel do bispo de Roma, como sempre foi entendido
pelos católicos, é um papel de serviço e não de poder. E este serviço não tem a
mesma conotação que costumamos encontrar nos dias de hoje, como se significasse
bajulação das massas ou obediência subserviente às reivindicações da moda.
Bento XVI recebeu a difícil missão de governar mais de 1 bilhão de fiéis
católicos espalhados por um mundo plural onde o relativismo parece ser o último
dogma que se manteve de pé após o homem moderno e evoluído relegar o fenômeno
religioso ao terreno da superstição. E, na contramão das tendências modernas,
decidiu dar ao seu pontificado uma tônica de redescoberta e valorização da
identidade católica.
Esta posição foi manifestada tantas vezes que, até
mesmo por uma questão de honestidade, não é lícito a ninguém ignorá-la. Ainda
antes de ser eleito Papa, interpelado sobre o porquê de a Igreja Católica não
agir com um pouco mais de transigência diante das exigências morais dos nossos
dias – como o aborto, a contracepção, o casamento gay –, o então cardeal
Ratzinger respondeu que a maior parte dos protestantes já aceitava estas
práticas há muito tempo e nem por isso suas igrejas estavam com maior
popularidade que a Igreja Católica.
Em sua viagem à Alemanha em setembro do ano passado, o
Papa disse, em um encontro com seminaristas, que o número dos que pediam uma
flexibilização da doutrina moral da Igreja, por grande que chegasse a ser,
seria sempre uma falsa maioria. Porque a Igreja é formada também pelos
católicos dos séculos passados, de tal maneira que não é possível haver uma
maioria contra os apóstolos e os santos. Ninguém está obrigado a ser católico,
mas os que querem sê-lo têm a obrigação de professar a fé que é, afinal de
contas, precisamente aquilo que os define como católicos.
O Papa é guardião da fé, e não o seu artífice. Bento
XVI pode não estar governando da maneira como gostariam alguns católicos mais
progressistas, mas ninguém o pode acusar de estar sendo infiel à Igreja da qual
ele se apresenta como o maior dos servos.
Jorge Ferraz é analista de sistemas
e mantém o blog Deus lo Vult! (www.deuslovult.org), premiado como o melhor blog pessoal de religião do
Brasil pelo júri acadêmico do Top Blog 2011.